90% dos Conselhos de Enfermagem do mundo veem risco de aumento no abandono da profissão

Estudo do Conselho Internacional de Enfermagem (ICN, na sigla em inglês) associa condições de trabalho a desistência dos profissionais

13.07.2021

Enfermeira chinesa após plantão do covid-19

Condições de trabalho e baixo investimento em formação têm levado à escassez internacional de profissionais de Enfermagem. Um estudo global do Conselho Internacional de Enfermagem (ICN, na sigla em inglês) mostrou que 90% das entidades nacionais da categoria temem que o estresse e as más condições de trabalho potencializados pelo enfrentamento à pandemia resultem em um aumento do abandono da profissão.

A formação de 13 milhões de novos profissionais seria necessária para garantir a prestação do serviço de saúde no futuro, avalia o ICN. A situação é mais crítica nos países em desenvolvimento, que enfrentam a “fuga de cérebros” — migração de profissionais qualificados para nações mais ricas, onde salários são maiores.

A pandemia da Covid-19 deu ao mundo oportunidade de ressignificar a contribuição e valor do trabalho do profissional de enfermagem diante da crise humanitária. A pandemia deu visibilidade à categoria na mídia. No entanto, a saúde e a segurança dos cuidadores se manteve em risco, com medidas insuficientes de compensação ao risco adicional posto pela doença na maioria dos países.

No Brasil, houve uma diminuição da remuneração da Enfermagem no contexto da pandemia. “É absurdo que, em plena pandemia, o DIEESE tenha registrado uma queda dos salários da Enfermagem, que está na linha de frente do combate ao covid-19″, afirma a presidente do Cofen, Betânia Santos, que defende a criação de um Piso Salarial Nacional.

A pandemia coloca também na atividade da Enfermagem o peso do stress pós-traumático depois que a emergência de saúde acabar. Isso pode influir ainda mais no abandono da profissão, de acordo com as previsões da professora Dorisdaia Humerez, coordenadora da Comissão Nacional de Enfermagem em Saúde Mental do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen). “A aprovação de um piso salarial nacional teria potencial de solucionar ou, no mínimo, atacar o problema do abandono profissional na categoria”, avalia.

Em Brasília, profissionais de Enfermagem homenageiam mortos pela covid

“Temos uma carga horária de 12h ao dia. Sem piso salarial e para manter a dignidade, o profissional trabalha geralmente em 2 empregos. A maioria é mulher e tem a jornada doméstica e a educação dos filhos. Se essa situação for revertida com leis, essa poderia, a meu ver, ser uma saída”, projetou Dorisdaia.

A pandemia colocou pressões inéditas sobre a Enfermagem. No atendimento aos profissionais no Brasil, foi constatada a exaustão geral, casos de abuso de medicamentos, consumo descontrolado de álcool e o desejo de desistir das funções, o que acaba não acontecendo porque os enfermeiros precisam do salário para viver e sustentar a família. “A população aplaudiu (o enfermeiro), mas eles são convidados a deixar os prédios onde moram para não infectar moradores”, lamenta.

Formação desordenada – No Brasil, a formação desordenada e proliferação de cursos de baixa qualidade leva a um excesso de profissionais, distribuídos de forma desigual pelo território e nem sempre capaz de atender as demandas da Saúde Coletiva. São 2,5 milhões de profissionais de Enfermagem registrados, entre auxiliares, técnicos, enfermeiros e obstetrizes nos 26 estados da federação e mais o Distrito Federal. “O fenômeno foi agravado pela EAD, que barateia a formação, sem oferecer campo de prática, estágio e condições mínimas para uma formação teórico-prática”, explica Dorisdaia. Isto se reflete também em achatamento salarial e desemprego aberto, registrados na Pesquisa Perfil da Enfermagem no Brasil (Cofen/Fiocruz).

Piso Salarial – A regulamentação da jornada de trabalho e criação de um Piso Salarial Nacional, previstos no Projeto de Lei 2564, podem contribuir para a melhoria das condições de trabalho e assistência de Enfermagem. O Cofen tem atuado junto ao Congresso Nacional para sensibilizar senadores e deputados, pedindo celeridade na aprovação do PL de autoria do senador Fabiano Contarato (REDE-ES), que recebeu parecer favorável da relatora e obteve as assinaturas necessárias para que entre em pauta pelo Senado. O projeto recebeu quase uma centena de pedidos de urgência, mas segue sem data de votação definida.

 

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