3º Seminário Intercultural reforça protagonismo da Enfermagem no cuidado aos povos indígenas e ribeirinhos

Evento acontece na cidade de Boa Vista (RR). Primeiro dia de seminário defendeu cuidado alinhado ao respeito à diversidade cultural

29.04.2024

Por muito tempo excluídos do olhar do Estado, as populações originárias e ribeirinhas sofrem até hoje com os efeitos da ausência histórica de políticas públicas de saúde qualificadas. Buscando propor soluções e ampliar a discussão sobre o tema, a Comissão Nacional de Enfermagem em Saúde Intercultural do Conselho Federal de Enfermagem (Conenfsi/Cofen) deu início, nesta segunda-feira (29/4), ao 3º Seminário Nacional de Saúde Intercultural, na cidade de Boa Vista (RR). O evento chama a atenção para a importância da categoria na oferta de um cuidado multifacetado, que fuja das amarras impostas pelo etnocentrismo e que não ultrapasse os conhecimentos e particularidades culturais desses grupos. 

Sob essa lente, a mensagem principal do primeiro dia de evento foi uníssona: de que o cuidado eficaz de Enfermagem deve compreender as diferentes crenças, valores e modos de vida. Luciane Tomas e Alessandra dos Santos, pertencentes às etnias indígenas Makuxi e Wapichana, respectivamente, acompanharam o seminário e reforçaram essa visão. 

“É fundamental que a Enfermagem que atue com as populações originárias e ribeirinhas entenda que temos nossas singularidades. Quando falamos dos povos indígenas, especificamente, não falamos apenas de um único grupo, mas de diferentes etnias. Os profissionais precisam compreender essa diversidade e adequar o cuidado de saúde, para que seja otimizado e cumpra seu objetivo”, pontuou Luciane, que atualmente cursa o terceiro período de Enfermagem.

O seminário, que neste ano tem como tema “A diversidade cultural indígena e ribeirinha: diálogos, desafios e perspectivas sob o olhar da Enfermagem”, é realizado com o apoio do Conselho Regional de Enfermagem de Roraima (Coren-RR). A programação conta com palestras comandadas por pesquisadores e profissionais especialistas. O evento, que acontece até esta terça-feira (30/4), está sendo transmitido por meio do CofenPlay e conta com emissão de certificado para os participantes. 

A cerimônia de abertura contou com a participação de Daniel Menezes de Souza, vice-presidente do Cofen, Josias Neves, conselheiro federal, Tárcia Barreto, presidente do Coren-RR, e Paulo Murilo de Paiva, coordenador da Conenfsi. “Que possamos nestes dois dias de seminário construir momentos intensos de reflexão que nos levem a uma Enfermagem mais forte e mais preparada para cuidar da população”, destacou Daniel Menezes.

“É crucial reconhecer não apenas os desafios enfrentados, mas também as conquistas que foram alcançadas pelos profissionais de Enfermagem que no atendimento a essas parcelas da nossa sociedade. Que esse seminário seja um espaço para ampliarmos nossa compreensão, fortalecer nossa solidariedade e renovar o nosso compromisso com uma Enfermagem mais inclusiva e mais sensível às diversas realidades culturais que envolvem o nosso país”, ressaltou Tárcia Barreto.

“O seminário fortalece o compromisso dos Conselhos de Enfermagem com uma assistência de qualidade aos povos em situação de vulnerabilidade. O Cofen, por meio da Conenfsi, vem realizando o mapeamento e o desenvolvimento de estratégias e ações para que profissionais da Enfermagem possam prestar uma assistência de excelência e de equidade a todos os brasileiros e estrangeiros dentro do nosso país”, frisou Paulo Murilo de Paiva.

Perspectiva profissional – Ainda durante a manhã, os participantes do evento acompanharam a palestra “Perspectiva do profissional de saúde no contexto do cuidado aos povos originários e ribeirinhos”, mediada por Elaine Florencio, integrante da Câmara Técnica de Saúde Indígena do Coren-RR, e ministrada por João Araújo, membro da Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente do Ministério da Saúde (SVSA/MS), Luciana Freitas, servidora da Secretaria Municipal de Saúde de Manaus, e Paulo Moraes, consultor técnico no Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Yanomami.

“Onde a Enfermagem se encaixa no cuidado aos povos indígenas e ribeirinhos?”, indagou João Araújo. Por muito tempo, foi introduzido na Enfermagem uma noção de que o conhecimento que levamos para essas comunidades deve prevalecer. Esse pensamento, carregado de etnocentrismo, deve acabar. Temos que nos habituar a conviver em espaços onde o cultural prevalece, para entender que os saberes tradicionais são tão importantes quanto aquele biomedicinal trazido por nós”.

“Ao falarmos da assistência de Enfermagem aos grupos em vulnerabilidade, a equidade é palavra de ordem. É preciso que aprimoremos o diálogo entre os sistemas de saúde, pensando sempre em como devemos adequar os princípios do Sistema Único de Saúde (SUS) para o cuidado a esses povos”, acrescentou Paulo Moraes.

Relatos de experiência na assistência aos ribeirinhos – A tarde do primeiro dia de seminário foi focada na apresentação de relatos de experiência. Guilherme Júnior, Tatiana Calandrini e Leandro Santos abriram o turno em uma palestra voltada ao compartilhamento de trajetórias no cuidado aos povos ribeirinhos. 

Calandrini, enfermeira e professora, divulgou os resultados de sua pesquisa sobre adolescentes ribeirinhos. “Ao longo da coleta de dados, encontramos inúmeros desafios, especialmente a gravidez, e problemas correlatos como a sexualidade, a rede de apoio fragilizada e a falta de pleno acesso à educação, à saúde e ao lazer”. 

Relatos de experiência na assistência aos indígenas – Finalizando a programação, a enfermeira Jailcy Silva, integrante do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Leste de Roraima, e Zilmar Augusto, conselheiro do Conselho Regional de Enfermagem do Amazonas (Coren-AM), dividiram suas experiências. A mesa contou com mediação de Reginaldo José, integrante da Câmara Técnica de Saúde Indígena do Coren-RR.

Jailcy Silva compartilhou com os presentes sua experiência em diferentes comunidades indígenas, destacando o papel da equipe de Enfermagem que fazia parte no aumento das taxas de vacinação e no combate às fake news. Zilmar Augusto, que também é docente da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), divulgou os resultados de seu artigo sobre a prevalência de hipertensão arterial em indígenas.

Fragilidade na saúde indígena – Episódios recentes de crises humanitárias envolvendo populações originárias no país, como a tragédia que tem acometido os Yanomami, mostram a urgência na elaboração políticas mais sólidas que otimizem o cuidado a esses povos e que permitam às equipes multiprofissionais de saúde atuarem com integralidade, superando dificuldades como difícil acesso e baixos salários. A insegurança também é um problema latente, pois em muitos territórios a atuação desenfreada de garimpeiros e grileiros, bem como a ausência de fiscalização, impedem a assistência e facilitam o aumento de agravos como pneumonia, desnutrição, tuberculose e malária.

 

Fonte: Ascom - Cofen

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