PARECER DE CÂMARA TÉCNICA N° 004/2013/CTAS/COFEN

Federação Brasileira de Hemofilia - Treinamento de infusão endovenosa para pacientes, familiares e cuidadores.

30.03.2017

PARECER DE CÂMARA TÉCNICA N° 004/2013/CTAS/COFEN

 

Federação Brasileira de Hemofilia. Treinamento de infusão endovenosa para pacientes, familiares e cuidadores.

I — DA CONSULTA

Trata-se de encaminhamento a CTAS, pela Presidência do Cofen, do PAD Cofen n° 428/2012, para emissão de Parecer sobre Solicitação de contribuição do COFEN para que as pessoas com hemofilia, Von Willebrand e outras coagulo patias hereditárias do Brasil tenham acesso ao tratamento domiciliar com os fatores de coagulação endovenosos. Compõe os autos processuais o seguinte documento: a) Oficio Cofen n° 27/2012 Presidência (fi 01) que versa sobre solicitação da Federação Brasileira de Hemofilia sobre posicionamento do Cofen a respeito de treinamento único no Brasil com pacientes, familiares e cuidadores para a infusão endovenosa dos fatores de coagulação a ser ministrado pelo corpo de enfermagem dos Centros de Tratamento de Hemofilia.

II— DA ANÁLISE TÉCNICA
As coagulo patias hereditárias são doenças hemorrágicas resultantes da deficiência quantitativa e/ou qualitativa de unia ou mais das proteínas plasmáticas (fatores) da coagulação. Têm como característica comum à redução da formação de trombina, fator essencial para a coagulação do sangue. Pacientes acometidos por coagulo patias hereditárias podem apresentar sangramentos de gravidade variável, espontâneos ou pós-traumáticos, presentes ao nascimento ou diagnosticados ocasionalmente (KES SLER, 2009).

Existem três tipos de tratamento para assistência aos pacientes com hemofilia: tratamento por demanda, quando o fator de coagulação é aplicado somente após a ocorrência de um episódio hemorrágico; tratamento profilático, quando o fator é infundido preventivamente aos episódios, com o objetivo de evitar possíveis sangramentos e tratamento domiciliar quando o paciente retira e leva para casa um quantitativo de fator para que possa utilizar por 06 a 12 meses ou até mais tempo.
No Brasil, o tratamento da hemofilia tem sido geralmente, realizado em centros especializados, normalmente distantes da residência do paciente, na forma de tratamento sob demanda (administração de fator coagulante, em ambiente hospitalar/ambulatorial, na vigência de sangramento). Em 2007, o Ministério da Saúde reviu as orientações iniciais contidas no programa mantendo todo o conteúdo inicial, porém aumentando para três (03) o número de doses a serem liberadas para o paciente (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2007).

A eficácia da terapêutica no episódio hemorrágico em pacientes com hemofilia depende do acesso imediato ao concentrado de fator, com utilização da via endovenosa, o que abrevia o sangramento e a extensão do dano tissular. Além do mais, sabe-se que a terapia de reposição empregada no início do sangramento, reduz a quantidade necessária de fator necessária ao controle do quadro hemorrágico.

A terapia domiciliar, definida como a injeção intravenosa de concentrado de fator fora do ambiente hospitalar e sem a supervisão médica ou de enfermagem direta, foi primeiramente descrita em 1970. A terapia domiciliar obteve grande aceitação pela comunidade de pacientes com hemofilia e o reconhecimento da Federação Mundial de Hemofilia (FMH) com a ressalva de que o programa seria um integrante adicional ao tratamento multidisciplinar do paciente com hemofilia (MANCO-JOl-INSON, 2007).

No Brasil existe, desde 1999/2000, o Programa de Dose Domiciliar (DD), inicialmente denominado Dose Domiciliar de Urgência (DDU que tem o objetivo de oferecer aos pacientes com hemofilia, uma dose unitária de concentrado de fator para auto infusão domiciliar, suficiente para elevar o nível plasmático do fator deficiente a 20%-30%. Esta terapia permite, além do tratamento precoce do evento hemorrágico, a redução do “stress” relacionado à necessidade de locomoção até o serviço específico e à participação ativa do paciente no seu tratamento (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2005).

Em síntese, os programas de atenção pública ao paciente hemofílico preveem a auto aplicação de concentrados de fator de coagulação pelo paciente ou pelo familiar responsável todas as vezes que houver suspeita de sangramento ou ocorrer trauma em algum lugar do corpo. Para tanto, o paciente deverá estar cadastrado no programa de hemofilia em um hemocentro, participar de reunião de esclarecimento sobre a inserção no programa e participar de treinamentos para aprender a aplicar o concentrado de fator por via endovenosa (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2007).

Para este fim o paciente recebe todo o material: frascos contendo o fator de coagulação liofilizado (Fator Vila derivado de plasma – Fator recombinante de coagulação Vila, constituído de pó liofilizado e diluente para injeção), material para desinfecção e dispositivo apropriado acesso venoso. O manual assim como o material para treinamento do paciente apresenta descrições e ilustrações com o passo a passo para a infusão segura do fator de coagulação.

Com o progresso científico surgiram as diversas teorias de enfermagem e estas possibilitam observar como é focalizada atualmente a enfermagem devendo ser utilizadas com a finalidade de conferir maior eficiência à prática.
As teorias existem para a promoção de mudança na prática profissional, possibilitam criar novas pesquisas para serem aplicadas na prática e remodelar as estruturas de regras e princípios. O trabalho de Orem tem contribuído para o aprendizado do autocuidado na prática de enfermagem (DIÓGENES e PAGLIUCA, 2003).

A teoria do autocuidado de Orem se adequa a toda pessoa que necessita de autocuidado, portanto pode perfeitamente ser direcionada para a prevenção de problemas de saúde em clientes de risco, como os hemofilicos, uma vez que têm a doença como um agravante e que por ser crônico-degenerativa necessitam essas clientes de um processo educativo sistematizado. O (a) enfermeiro (a) tendo corno seu objeto de trabalho o cuidado de enfermagem visto sob a forma de autocuidado leva o paciente e seus familiares a participar desse cuidado na medida de suas capacidades.
Neste contexto, o enfermeiro deve educar o paciente para o correto acesso ao leito venoso e também para o reconhecimento precoce de hipersensibilidade aos constituintes do medicamento (Proteina de hamsters ou boi). Além disso, o paciente deverá estar atento para: dor, febre, dor de cabeça, vômito, alterações da pressão arterial, rash cutâneo e urticaria (MATOS e PIRES, 2009).
A Organização Mundial de Saúde (OMS) sugere como práticas educativas em saúde para hemofílicos e familiares a realização de workshops educacionais e de capacitação para pacientes e familiares, a: utilização de materiais educativos para a complementação das orientações aos pacientes e às famílias com acesso à informação e apoio ao autogerenciamento fora do estabelecimento de saúde utilizando telefone ou Internet, assim como, o uso de recursos computadorizados para a preparação de materiais individualizados de autogerenciamento (OMS; 2003).

III – DAS CONSIDERAÇÕES ÉTICAS E LEGAIS

O respaldo para as práticas de enfermagem relacionadas ao paciente hemofílico e seus familiares responsáveis encontra-se já evidenciado na alínea “m” da lei 7498\86— sendo, portanto, enfatizado ser responsabilidade do enfermeiro os cuidados de Enfermagem de maior complexidade técnica e que exijam conhecimentos de base cientifica e capacidade de tomar decisões imediatas.

O tratamento ao paciente hemofilico também é previsto no código de ética dos profissionais de enfermagem, pois pode ser contextualizado na resolução COFEN n° 311/2007 em seu art. 50, que determina que o profissional de enfermagem preste assistência a saúde visando à promoção do ser humano como um todo. Tal resolução tem reforço no art. 22°, que assinala que o enfermeiro deve exercer a sua profissão com justiça, responsabilidade, competência e honestidade. Isso responsabiliza este profissional na prestação de informações adequadas ao cliente e as famílias sobre a assistência de enfermagem, possíveis benefícios, riscos e consequências que possam ocorrer.

No Brasil, as leis que respaldam o monitoramento do paciente com hemofilia são as mesmas voltadas aos pacientes com doenças crônicas. A Lei n° 8.080, de 19 de setembro de 1990, que regula em todo o território nacional, as ações e serviços de saúde. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes.

A Lei n° 8.142, de 28 de dezembro de 1990, atua de maneira complementar, pois aborda a participação do governo nessa garantia do acesso aos cuidados, aponta a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) e aborda questões sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área de saúde. Considerando a necessidade de promover mudanças de atitude em todas as práticas de atenção e gestão que fortaleçam a autonomia e o direito do cidadão (Ministério da Saúde, 2006), há leis que defendem os direitos de portadores de doenças como a hemofilia. A Lei federal n° 1044, por exemplo, no item A, de 21/10/69, defende os direitos dos alunos com afecção congênita, garantindo, entre outras coisas, a realização de segunda chamada para os alunos que faltarem às provas para tratamento.
Também deve ser considerado o disposto na RDC-45\ANVISA artigo “3.2.2” que diz ser o enfermeiro responsável pela administração de soluções parenterais e prescrição dos cuidados de enfermagem em âmbito hospitalar, ambulatorial e domiciliar. Assim, consideramos que o enfermeiro responsável pela liberação do fator visite regularmente o domicilio do paciente cadastrado no programa de assistência do Ministério da Saúde e mantenha registro FORMAL E OFICIAL (Prontuário) das condições clínicas gerais deste paciente. Bem como, planeje e implemente programas de melhoria de assistência clínica e de qualidade de vida do mesmo quando julgar necessário.

IV – DO PARECER
Considerando o que preconiza a carta de direitos do paciente hemofílico de receber os cuidados apropriados ao seu estado de saúde, no âmbito dos cuidados preventivos, curativos, de reabilitação e terminais e também considerando os riscos descritos para a administração endovenosa de fator recombinante, sugerimos a redação de normativa pelo Conselho Federal de Enfermagem com a finalidade de determinar que, sendo a administração de medicamentos uma responsabilidade do enfermeiro (Decreto lei 94.406\87 – COFEN 2000), este somente permita a execução desta prática pelo paciente hemofihico ou seu responsável quando: após realização de treinamento avaliar que o paciente ou familiar\responsável esteja devidamente treinado e esclarecido para reconhecer precocemente os sinais e sintomas de complicações decorrentes da administração do fármaco em questão.

Esta Câmara Técnica sugere ainda a revisão de Parecer emitido pelo Coren-SP N° 003/2011, cuja conclusão aponta que o Enfermeiro, bem como os demais profissionais da equipe de enfermagem ensinar ao paciente ou a um cuidador a realização de punção venosa e administração de medicamentos por esta via.

É o parecer, salvo melhor juízo.

Brasília, 04 de novembro de 2013.

Parecer elaborado por Márcio Barbosa da Silva, Coren-SE n°105.172, Jacqueline Dantas Sampaio, Coren-CE n° 53.925, Maria Lucrécia Pereira Góis, Coren-AC n° 59.879, Maria Lurdemiler Sabóia Mota, Coren-CE n° 73918 e Raquel Cristina Diniz, Coren-ES n°109.251, na XV Reunião Ordinária da CTAS.

MÁRCIO BARBOSA DA SILVA
Coren-SE n°105.172
Coordenador da CTAS

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