PARECER DE CÂMARA TÉCNICA Nº 034/2019/CTAS/COFEN

Irradiação Intravascular a Laser no Sangue – ILIB realizado por Enfermeiro.

24.06.2019

PARECER DE CÂMARA TÉCNICA Nº 034/2019/CTAS/COFEN
REFERÊNCIA: PAD Cofen Nº 0432/2019
INTERESSADO: Coren-RO

IRRADIAÇÃO INTRAVASCULAR A LASER NO SANGUE – ILIB REALIZADO POR ENFERMEIRO.

 

I- DOS FATOS

É submetido à Câmara Técnica de Atenção à Saúde do Cofen, através do Despacho do Departamento de Gestão do Exercício Profissional (DGEP), contido no Despacho GAB/PRES n 01035/2019, no expediente da folha 05 do PAD 0432/2019. Trata-se de solicitação do Coren-RO, para emissão de parecer desta Câmara Técnica, sobre a legalidade da Técnica de Irradiação Intravascular a Laser no Sangue – ILIB. Este Coren foi provocado através de um Ofício do CREMERO (N. 0072/2019-PRESIDÊNCIA), contendo denúncia sobre a prática sendo realizada por profissional Enfermeiro. Destarte, após levantamento da questão na literatura científica e na legislação em vigor, edificamos este parecer técnico.

 

II- DOS CONSIDERANDOS CIENTÍFICOS

Segundo a Sociedade Internacional de Aplicação Médica de Laser – ISLA (2013), os lasers de baixa intensidade, nos últimos anos, tiveram sua importância potencializada, pois sua gama de aplicações é extensa. Podem ser usados de diversas formas: para tratamentos externos, intravenosos, intra-articulares, intersticiais e fotodinâmicos. Após anos de desenvolvimento, lasers altamente focados, também conhecidos como agulhas de laser, permitem a aplicação de luz laser profunda no tecido. Assim, efeitos reparadores de uma grande variedade podem ser alcançados no tecido por uma combinação de diferentes comprimentos de onda do laser (laser vermelho, infravermelho, verde e azul).

Num estudo da literatura científica recente, pudemos perceber que a terapia a laser de baixa intensidade e a irradiação intravascular do sangue (ILIB) são amplamente utilizadas no tratamento de diversas patologias, no controle da dor, de distúrbios do sono, doenças metabólicas, lesão medular, traumatismo cranioencefálico e acidente vascular cerebral. São consideradas ferramentas de baixa potência que podem ser aplicadas em muitos eventos clínicos para facilitar a circulação (Yang, Lin e Chang, 2017). No estudo russo de Burduli e Gabueva (2016), com uso da terapia com irradiação intravascular do sangue, foram destacados os seguintes benefícios: ativação do sistema imunológico, aumento da atividade bactericida do soro sanguíneo e do sistema complemento e melhoria da dinâmica dos indicadores de função respiração externa, em pacientes com patologias respiratórias. O estudo, também russo, de Burduli e Balayan (2014), comprova melhora de pacientes com refluxo grastoesofagiano, submetidos a ILIB, quando comparados a um grupo controle que não recebeu a irradiação com laser no sangue. Já nos estudos de Kazemikhoo e Ansari (2015), os efeitos da ILIB foram considerados benéficos no tratamento clínico de pacientes diabéticos tipo 2, por reduzir níveis sérios de glicose no sangue.

Entretanto, ao buscar fundamentação teórica, correlacionando a utilização do ILIB na estética, não fomos bem sucedidos. Utilizamos descritores em português (mesmo não oficializados no Decs): Laser no sangue, irradiação intravascular, terapia com luz de baixa intensidade e terapia da vitalidade; e em inglês: Laser irradiation in the blood, therapy ILIB, intravascular laser irradiation of blood. E ainda assim, as ligações foram escassas. Na biblioteca virtual scielo não encontramos correspondências; nas bases de dados Pubmed, 21 artigos, na Lilacs, 19, na Medline, 19, e na Cochrane, 35. Todos eles sem associações com a área estética.

 

III- DOS CONSIDERANDOS JURÍDICOS, ÉTICOS e LEGAIS

Considerando a Constituição Federal – Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos em seu artigo 5º, inciso XIII, a saber:

É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer.

Considerando a Lei nº 7498/86 que dispõe sobre a regulamentação do exercício da Enfermagem, e dá outras providências, a saber:

Em seu artigo 11. O Enfermeiro exerce todas as atividades de enfermagem, cabendo-lhe:

I – privativamente:

(…) i) consulta de enfermagem;

j) prescrição da assistência de enfermagem;

(…)

m) cuidados de enfermagem de maior complexidade técnica e que exijam conhecimentos de base científica e capacidade de tomar decisões imediatas;

II – como integrante da equipe de saúde:

a) participação no planejamento, execução e avaliação da programação de saúde;

b) participação na elaboração, execução e avaliação dos planos assistenciais de saúde;

 (…)

f) prevenção e controle sistemático de danos que possam ser causados à clientela durante a assistência de enfermagem;

(…)

Considerando o Decreto nº 94.406/87 que Regulamenta a Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986, que dispõe sobre o exercício da Enfermagem e dá outras providências, a saber:

Art. 8º Ao Enfermeiro Incumbe, II – como integrante de equipe de saúde:

a) participação no planejamento, execução e avaliação da programação de saúde;

b) participação na elaboração, execução e avaliação dos planos assistenciais de saúde;

 (…)

f) participação na elaboração de medidas de prevenção e controle sistemático de danos que possam ser causados aos pacientes durante a assistência de enfermagem.

Considerando a Resolução Cofen nº 564/2017, que aprova o novo Código de Ética dos profissionais de Enfermagem, a saber:

É um direito: Art. 1º Exercer a Enfermagem com liberdade, segurança técnica, científica e ambiental, autonomia, e ser tratado sem discriminação de qualquer natureza, segundo os princípios e pressupostos legais, éticos e dos direitos humanos.

Art. 4º Participar da prática multiprofissional, interdisciplinar e transdisciplinar com responsabilidade, autonomia e liberdade, observando os preceitos éticos e legais da profissão.

É dever: Art. 39 Esclarecer à pessoa, família e coletividade, a respeito dos direitos, riscos, benefícios e intercorrências acerca da assistência de Enfermagem.

Art. 40 Orientar à pessoa e família sobre preparo, benefícios, riscos e consequências decorrentes de exames e de outros procedimentos, respeitando o direito de recusa da pessoa ou de seu representante legal.

Art. 50 Assegurar a prática profissional mediante consentimento prévio do paciente, representante ou responsável legal, ou decisão judicial.

Art. 59 Somente aceitar encargos ou atribuições quando se julgar técnica, científica e legalmente apto para o desempenho seguro para si e para outrem.

É proibido: Art. 62 Executar atividades que não sejam de sua competência técnica, científica, ética e legal ou que não ofereçam segurança ao profissional, à pessoa, à família e à coletividade.

Art. 63  Colaborar ou acumpliciar-se com pessoas físicas ou jurídicas que desrespeitem a legislação e princípios que disciplinam o exercício profissional de Enfermagem.

Art. 70 Utilizar dos conhecimentos de enfermagem para praticar atos tipificados como crime ou contravenção penal, tanto em ambientes onde exerça a profissão, quanto naqueles em que não a exerça, ou qualquer ato que infrinja os postulados éticos e legais.

Art. 75 Praticar ato cirúrgico, exceto nas situações de emergência ou naquelas expressamente autorizadas na legislação, desde que possua competência técnica-científica necessária.

Art. 80 Executar prescrições e procedimentos de qualquer natureza que comprometam a segurança da pessoa.

Art. 81 Prestar serviços que, por sua natureza, competem a outro profissional, exceto em caso de emergência, ou que estiverem expressamente autorizados na legislação vigente.

Art. 84 Anunciar formação profissional, qualificação e título que não possa comprovar.

(Grifos nossos).

Considerando a Resolução Cofen nº 358/2009, que dispõe sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem e a implementação do Processo de Enfermagem em ambientes, públicos ou privados, em que ocorre o cuidado profissional de Enfermagem, e dá outras providências. A saber:

Art. 1º O Processo de Enfermagem deve ser realizado, de modo deliberado e sistemático, em todos os ambientes, públicos ou privados, em que ocorre o cuidado profissional de Enfermagem; (…)

Art. 3º O Processo de Enfermagem deve estar baseado num suporte teórico que oriente a coleta de dados, o estabelecimento de diagnósticos de enfermagem e o planejamento das ações ou intervenções de enfermagem; e que forneça a base para a avaliação dos resultados de enfermagem alcançados; (…)

Art. 4º Ao enfermeiro, observadas as disposições da Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986 e do Decreto nº 94.406, de 08 de junho de 1987, que a regulamenta, incumbe a liderança na execução e avaliação do Processo de Enfermagem, de modo a alcançar os resultados de enfermagem esperados, cabendo-lhe, privativamente, o diagnóstico de enfermagem acerca das respostas da pessoa, família ou coletividade humana em um dado momento do processo saúde e doença, bem como a prescrição das ações ou intervenções de enfermagem a serem realizadas, face a essas respostas. (Grifos Nossos).

Considerando a Resolução Cofen Nº 581/2018, que atualiza, no âmbito do Sistema Cofen/Conselhos Regionais de Enfermagem, os procedimentos para Registro de Títulos de Pós-Graduação Lato e Stricto Sensu concedido a Enfermeiros e aprova a lista das especialidades:

Em seu anexo, itens 11. Enfermagem Dermatológica e 15. Enfermagem Estética

Considerando a Resolução Cofen Nº 568/2018, que aprova o Regulamento dos Consultórios de Enfermagem e Clínicas de Enfermagem:

Art. 3º Os Enfermeiros, quando da atuação em Consultórios e Clínicas de Enfermagem, poderão realizar as atividades e competências regulamentadas pela Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986, pelo Decreto nº 94.406, de 08 de junho de 1987, e pelas Resoluções do Conselho Federal de Enfermagem.

 

IV – DO PARECER

A Câmara Técnica de Atenção à Saúde do Cofen destaca, preliminarmente, que o desenvolvimento da área de estética para os Enfermeiros tem-se configurado, ao longo dos anos, como importante passo para o estímulo ao empreendedorismo a ampliação do acesso da população a este tipo de cuidado à saúde. E é cristalina a ideia de que com o desenvolvimento tecnológico, diversos procedimentos surgem e surgirão, exigindo dos profissionais a adaptação e imersão nestes novos conhecimentos. E que esta dinâmica demandará a necessidade de regulação.

Considerando esta premissa, destacamos que todos os procedimentos de enfermagem devem ser planejados à luz da legislação em vigor, especialmente no que tange ao processo de enfermagem, que entende o trabalho deste profissional de forma essencial e complexa e que não admite omitir fases durante o processo de cuidado. Dificilmente, um procedimento isolado se consolidará na Enfermagem. Além desta, todos os avanços na categoria necessitam imperiosamente de evidências científicas sólidas, encontradas em estudos de relevância nacional e internacional, com amostragem relevante e consideração de potenciais riscos aos pacientes.

Do mesmo modo, avultamos neste parecer que o Enfermeiro ao assumir a execução dos tratamentos estéticos deve responder pelos resultados esperados e arcar com todas as responsabilidades decorrentes do Código Civil, Penal e Ético, inclusive pelo resultado adverso ao pretendido ou oferecido.

Especialmente sobre a aplicação da Técnica de Irradiação Intravascular a Laser no Sangue – ILIB, entendemos que com a devida qualificação, o Enfermeiro não encontraria dificuldades em executá-la. Uma vez que as competências para esta, seriam identificadas cientificamente. Entretanto há uma limitação clara para a realização da técnica atualmente, que é o déficit de evidências científicas que comprovam a eficácia da técnica na área estética e, desta forma, não é possível assegurar assistência de qualidade e livre de riscos nesta área. Esta deficiência impede o Enfermeiro de executar a técnica, pois confronta diversos dispositivos legais da profissão, especialmente, as Leis do Exercício Profissional e o Código de Ética. O que nos resta, por fim, sinalizarmos pela não legalidade do profissional enfermeiro em realizar a técnica em questão.

 

É o parecer, salvo melhor juízo.

Brasília, 28 de março de 2019.

 

 

José Gilmar Costa de Souza Júnior
Coordenador da Câmara Técnica de Atenção à Saúde do Cofen – CTAS
Coren-PE 120.107– ENF

Parecer elaborado por Dr. José Gilmar Costa de Souza Junior Coren-PE 120.107, Dra. Isabel Cristina Kowal Olm Cunha Coren-SP 9.761, Dr. Mário Antonio Moraes Vieira Coren-PA 32.593, Dr. Vencelau Jackson da Conceição Pantoja Coren-AP 75.956 e Dra. Viviane Camargo Santos Coren-SP 98.136.

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei nº 7.498 de 25 de junho de 1986, Dispõe sobre a regulamentação do exercício da enfermagem, e dá outras providências. Brasília. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7498.htm

CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM. Resolução nº 358 de 2009. Dispõe sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem e a implementação do Processo de Enfermagem em ambientes, públicos ou privados. Disponível em: < http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html>

BRASIL. Decreto nº 94.406, de 08 de junho de 1987, Regulamenta a Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986, que dispõe sobre o exercício da enfermagem, e dá outras providências. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1980-1989/D94406.htm

Yang WH; Lin SP; Chang ST. Case report: Rapid improvement of crossed cerebellar diaschisis after intravascular laser irradiation of blood in a case of stroke. Medicine (Baltimore); 96 (2): e. 5646, 2017 jan. 2017.Disponível em: https://journals.lww.com/md-journal/fulltext/2017/01130/Case_report_Rapid_improvement_of_crossed.12.aspx.

Burduli NM; Gabueva AA. The influence of low-intensity laser radiation on the functional activity of neutrophils in the patients presenting with community-acquired pneumonia. Vopr Kurortol Fizioter Lech Fiz Kult ; 93 (2): 9-12, 2016 mar-abr. Rússia, 2016. Disponível em: https://www.mediasphera.ru/issues/voprosy-kurortologii-fizioterapii-i-lechebnoj-fizicheskoj-kultury/2016/2/downloads/ru/460042-87872015022.

KazemiKhoo N; Ansari F. Blue or red: which intravascular laser light has more effects in diabetic patients?. Lasers Med Sci ; 30 (1): 363-6, Jan. Inglaterra, 2015. Disponível em: https://link.springer.com/article/10.1007%2Fs10103-014-1672-7.

Burduli NM; MM Balayan. Dinâmica da regulação autonômica e pHmetria diária em pacientes com doença do refluxo gastroesofágico sob a influência da irradiação de sangue de baixa intensidade. Eksp Klin Gastroenterol; (9): 39-43, 2014. Rússia, 2014.

Sociedade Internacional de Aplicação Médica de Laser – ISLA. Disponível em: https://www.isla-laser.org/research-group/en/who-we-are/

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