PARECER DE CÂMARA TÉCNICA Nº
3/2024/CTEP/COFEN


29.04.2024

PARECER DE CÂMARA TÉCNICA Nº 3/2024/CTEP/COFEN

 

                                                                                                                                        Análise do requerimento que solicita esclarecimentos sobre desvio de função na enfermagem.

 

PROCESSO Nº 00196.001151/2024-11

 

I. RELATÓRIO

Trata-se o presente de solicitação de esclarecimentos de profissional de Enfermagem do estado de Minas Gerais em relação à desvio de função no âmbito da equipe de enfermagem. A requerente cita como exemplo o caso de Auxiliares de Enfermagem que já haviam se submetidos a qualificação de Técnico de Enfermagem ou mesmo a graduação de Enfermagem e que continuam recebendo salários referentes aos seus cargos efetivos, os de Auxiliares de Enfermagem.   

Ressalta ainda, a interessada, que não recebeu em sua unidade de trabalho, nenhuma orientação no sentido de que estava apta a requerer o cancelamento da inscrição de auxiliar de enfermagem, ou outras informações a respeito dos requisitos das qualificações realizadas em qualquer nível.

 

II. FUNDAMENTAÇÃO

Para a análise mais acurada do assunto em tela, torna-se necessário a revisão de alguns conceitos, a exemplo do conceito de isonomia. O princípio da isonomia é conhecido como princípio da igualdade. Pautado no artigo 5º da Constituição Federal, ele garante a aplicação da legislação pelo judiciário levando em conta as particularidades de cada indivíduo, senão vejamos:

CAPÍTULO I — Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I — homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;

(…)

Relativo aos vencimentos dos servidores, a mesma regra poderá ser utilizada na hora de determinar esses valores, ou seja, ainda que no poder público, aquele que trabalha em cargos de atribuições iguais ou semelhantes, fará jus ao mesmo valor de vencimento. É importante salientar que a remuneração final, somados adicionais, pode ser diferente e esta não precisa estar equiparada. 

No que se refere a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o artigo 461º assevera que se a função dos (as) trabalhadores (as) for idêntica, eles (as) devem ter o mesmo salário. Contudo, servidores públicos não podem ter por referência esta lei, a fim de buscar equiparação salarial, visto que regidos por estatuto próprio.

Nesse sentido, uma orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho reforça a ideia de isonomia salarial. O texto classifica essa equiparação entre servidor público e trabalhador CLT “juridicamente impossível”, ainda que o funcionário público tenha sido contratado pela CLT.

Quanto à ascensão funcional, referida pela requerente em seu documento consulta, salvo melhor juízo, em se tratando de servidores públicos efetivos, regidos pelo regime jurídico único, não poderia ocorrer no sentido vertical, a exemplo da mudança de cargo efetivo de nível médio para nível superior, que somente poderia acontecer por meio de concurso público, porém, podendo ocorrer no sentido horizontal, por progressão funcional na carreira.

Nesse sentido, pacificado é o entendimento jurisprudencial, trazido pela Sumula Vinculante 43 do STF, que assim prevê:

É inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido.

Observa-se, em princípio no relatado pela profissional requerente, que há clara ocorrência de desvio de função, ou seja, pessoas com cargo efetivo de Auxiliar de Enfermagem exercendo função de Técnico de Enfermagem ou de Enfermeiro.

O desvio de função se caracteriza quando o servidor passa a exercer atribuições diversas daquelas que correspondem ao cargo efetivo para o qual ele foi nomeado e empossado, isto é, o exercício de atividades ou serviços estranhos à competência de um cargo.

Para a presente análise devemos registrar ainda o contido na Súmula 378 do STJ que prevê que “O servidor público que desempenha funções alheias ao cargo para o qual foi originariamente provido, em virtude de desvio funcional, faz jus ao pagamento das diferenças salariais correspondente a esse período, sob pena de locupletamento indevido por parte da Administração”. Senão vejamos o voto, in verbis:

Trata-se de recurso especial interposto pela União com fundamento no art. 105, inciso III, alíneas a e c, da Constituição Federal, em face de decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que restou ementada nos seguintes termos, litteris:

Administrativo. Desvio de função. Auxiliar de enfermagem. Concurso público. Reenquadramento.

O servidor que exerce funções diversas do cargo para o qual prestou concurso público tem direito apenas às diferenças de vencimento pelo desvio funcional, sob pena de inobservância da norma constitucional que estabelece como condição de ingresso no serviço público o prévio concurso público.

O reconhecimento do direito às diferenças não vulnera a Constituição Federal e tampouco nega vigência à Lei Federal n. 8.112/1990, que estabelece as formas de provimento nos cargos públicos, ao contrário, concretiza, na prática, o princípio da proteção à dignidade da pessoa do trabalhador, da qual não pode ser exigido trabalho gratuito, já que é própria do trabalho a característica da onerosidade.

Apelação da União não conhecida. Remessa oficial improvida.

Quanto à questão do registro profissional junto ao Coren, verifica-se já pacificado, que o mesmo deverá ser feito em consonância com o diploma ou certificado apresentado pelo profissional, devendo este possuir registro ativo em todas as categorias que possui atuação.

Quanto ao pagamento das anuidades devidas aos Conselhos profissionais, no âmbito da Enfermagem, podemos ressaltar o contido na Resolução Cofen nº 724/2023, em especial no seu artigo 3º, que assim prevê:

Art. 3º O profissional que tiver mais de uma inscrição, no mesmo Conselho Regional, pagará apenas a anuidade correspondente à inscrição da categoria de maior nível de formação, estando isento do pagamento referente às demais categorias em relação as quais também possua inscrição.

Diante do exposto, passamos a concluir.

 

III. CONCLUSÃO

1 – Quanto ao pedido de esclarecimentos sobre as “mudanças na legislação que regulamenta estruturação de cursos técnicos no país”, essas, se ocorreram, não interferem nas relações de trabalho relativos a desvios de função e não mudam o critério de ingresso em serviço público, permanecendo o acesso único e exclusivo pela via do concurso público;

2- Quanto à questão dos profissionais Auxiliares de Enfermagem que, por ventura, tenham realizado complementação para Técnico de Enfermagem ou mesmo concluído a graduação em Enfermagem, não adquirriem o direito de mudança de cargo efetivo em serviço público, sem o devido ingresso através de concurso público, entende-se pacificado o entendimento traduzido pela Súmula Vinculante 43 do STF, retro mencionada;

3- Em relação à queixa de que não teria recebido da sua unidade qualquer orientação no sentido de que estaria apta a requerer o cancelamento da inscrição de Auxiliar de Enfermagem, devemos esclarecer que, em princípio, inexiste essa possibilidade, visto que deverá manter inscrição em todas as categorias em que estiver exercendo a profissão de Enfermagem, tendo tão somente para fins financeiros, a dispensa do pagamento das anuidades do menor nível de formação, conforme previsão do art. 3º da Resolução Cofen nº 724/2023;

4- Ademais, relativo às demais questões referentes as relações de trabalho, orienta-se que estas podem ser dirimidas pelas Ouvidorias de cada Estado da federação brasileira, pelo Ministério Público do Trabalho ou mesmo pelas organizações sindicais do estado de Minas Gerais, onde a interessada atua como profissional de Enfermagem.

 

À consideração superior.

 

Parecer elaborado por: Dr. Gilvan Brolini, Coren – RR Nº 103.289-ENF, Coordenador da CTEP; Dr. Ítalo Rodolfo da Silva, Coren – RJ Nº 319.539-ENF, Membro e Secretário da CTEP; Dr. Carlos Rinaldo Nogueira Martins, Coren – AP 49.733-ENF, Membro da CTEP; Dr. José Maria Barreto de Jesus, Coren – PA Nº 20.306-ENF, Membro CTEP e Dr. Jorge Domingos de Sousa Filho, Coren – RO Nº 111.710-ENF, Membro da CTEP.

 

IV. REFERÊNCIAS

1 – CLT. Consolidação das leis do trabalho, Presidência da República, disponível no https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm

2 – Cofen. Resolução Cofen 724/2023 de 31.08.2023. Determina aos Conselhos Regionais de Enfermagem a aplicação da correção de 3,52% (INPC), quando da fixação das anuidades, taxas e serviços de 2024, e dá outras providências.

3 – STJ. Superior Tribunal de Justiça, Súmula 378, terceira seção, julgado em 24.02.2009, disponível em 29.02.2024 no https://scon.stj.jus.br/SCON/sumstj/doc.jsp?livre=%22378%22.num.&b=SUMU&p=false&l=10&i=1&operador=E&ordenacao=-@NUM

4 – STF. Súmula Vinculante 43. É inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido. Sessão Plenária de 26/11/2003. DJ de 9/12/2003, p. 1; DJ de 10/12/2003, p. 2; DJ de 11/12/2003, p. 2. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/jurisprudencia/sumariosumulas.asp?base=26&sumula=2348#:~:text=Precedentes.-,1.,o%20ingresso%20em%20cargos%20p%C3%BAblicos.

Fonte: https://www.cofen.gov.br/parecer-de-camara-tecnica-no-3-2024-ctep-cofen/

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