PARECER DE CONSELHEIRA FEDERAL No. 11/2023/PROGER/DPAC/SPC/COFEN


16.11.2023

PARECER DE CONSELHEIRA FEDERAL No. 11/2023/PROGER/DPAC/SPC/COFEN

 

Necessidade de Enfermeiro em clínicas médicas. 

 

PROCESSO Nº 00196.002232/2023-57

 

Necessidade de enfermeiro em clínicas médicas. Enfermeiro deve supervisionar técnicos e auxiliares de enfermagem em clínicas médicas.

 

1. Ofício Coren-SE Gab nº 029/2023 (SEI nº 0092312).

2. Existem competências específicas relativas às atividades de enfermagem, que guardam complexidades técnicas no acompanhamento do paciente, o que torna obrigatória a presença do enfermeiro em clínicas médicas.

3. É necessária a presença de enfermeiro em clínicas médicas, para planejar, executar, organizar e orientar as atividades de enfermagem desenvolvidas pelo técnicos e auxiliares de enfermagem.

4. É importante esclarecer que o rol de clínicas apontado no presente parecer é exemplificativo, para isso é importante ao fiscal descrever as características do serviço conforme orientação deste documento.

 

Ilustre Presidente do Conselho Federal de Enfermagem,

 

I. RELATÓRIO

 

Tendo em vista a 554ª reunião ordinária de plenário do Cofen, realizada de 19 a 23 de junho de 2023 (Extrato de Ata COFEN/PLEN/ASPLEN – SEI nº 0130235) a Presidente do Cofen designou, por meio da Portaria Cofen nº 1339, de 25 de Agosto de 2023, a Dra. Tatiana Maria Melo Guimarães – Conselheira Federal, a Dra. Tycianna Goes da Silva Monte Alegre – Procuradora-Geral do Cofen, a Dra. Graziela Pontes Cahu, Chefe da Fiscalização do Coren-PB, a Dra. Laíse Ellen Santos da Silva Fernandes – Assessora Jurídica do Coren-PE e o Dr. Roberto Martins de Alencar Nogueira – Procurador do Cofen e Chefe do Setor de Processos Contenciosos, a fim de tratarem da elaboração de parecer sobre tema específico do processo 00196.002232/2023-57.

 

1. OFÍCIO COREN-SE GAB Nº 029/2023 (SEI Nº 0092312)

 

Esse processo foi instaurado em razão do envio do Ofício Coren-SE Gab nº 029/2023 (SEI nº 0092312) no qual solicita:

 

“b) Posicionamento a respeito da fiscalização de clínicas médicas e a orientação do Conselho Federal de Medicina, bem como posicionamento do judiciário, sobre a desnecessidade de supervisão de enfermeiro nas referidas clínicas quando os procedimentos realizados sejam de baixa complexidade, assim como a possibilidade de médicos efetuarem a supervisão de auxiliares de enfermagem nos respectivos consultórios/clínicas médicas.”

Passemos ao estudo do tema.

 

II. FUNDAMENTAÇÃO

 

O Coren-SE trouxe à baila a demanda sobre a desobrigação de clínicas médicas possuir em seu quadro de pessoal enfermeiro. Por isso, o objeto discutido faz necessário pormenorizar algumas questões técnicas relativas às atividades de enfermagem realizadas em clínicas de atendimentos médicos, as quais são enquadradas no cadastro nacional de atividades econômicas (CNAE) como clínica médica na Classe 86.30-5, que engloba as atividades de atenção ambulatorial executadas por médicos.

Dentro dessa Classe, há 3 possíveis subclasses merecedoras de análise, a classe de nº 8630-5/01, a de nº 8630-5/02 e 8630-5/99 referente à atividade médica ambulatorial com recursos para realização de procedimentos cirúrgicos, à atividade médica ambulatorial com recursos para realização de exames complementares e às atividades de atenção ambulatorial não especificadas, respectivamente.

Em se tratando da classe de nº 8630-5/01, esta abarca as atividades de consultas e tratamento médico prestadas a pacientes que não estão sob regime de internação, como: ambulatórios, postos de assistência médica, clínicas médicas especializadas ou não, policlínicas, clínicas de empresas, desde que sejam equipados para a realização de procedimentos cirúrgicos.

De acordo com o Conselho de Medicina, RESOLUÇÃO CFM Nº 1.886, DE 13 DE NOVEMBRO DE 2008, os estabelecimentos de saúde que realizam procedimentos clínico-cirúrgicos de curta permanência, com ou sem internação, deverão ser classificados em Unidades tipo I, II, III e IV.

A Unidade tipo I é o consultório médico, independente de um hospital, destinado à realização de procedimentos clínicos, ou para diagnóstico, sob anestesia local, sem sedação, em dose inferior a 3,5 mg/kg de lidocaína (ou dose equipotente de outros anestésicos locais), sem necessidade de internação.

A Unidade tipo II é o estabelecimento de saúde, independente de um hospital, destinado à realização de procedimentos clínico-cirúrgicos de pequeno e médio porte, com condições para internações de curta permanência, em salas cirúrgicas adequadas a essa finalidade, realizam cirurgias/procedimentos de pequeno e médio porte, sob anestesia loco-regional (com exceção dos bloqueios subaracnóideo e peridural), com ou sem sedação. Deverá contar com salas de recuperação ou de observação de pacientes. O pernoite, quando necessário, será feito em hospital de apoio, sendo obrigatório garantir a referência para um hospital de apoio.

A Unidade tipo III é o estabelecimento de saúde, independente de um hospital, destinado à realização de procedimentos clínico-cirúrgicos, com internação de curta permanência, em salas cirúrgicas adequadas a essa finalidade, realiza cirurgias de pequeno e médio porte, sob anestesia loco-regional, com ou sem sedação, e anestesia geral com agentes anestésicos de eliminação rápida. Corresponde a uma previsão de internação por, no máximo, 24 (vinte e quatro) horas, podendo ocorrer alta antes deste período, a critério médico. Deverá contar com equipamentos de apoio e de infraestrutura adequados para o atendimento do paciente. A internação prolongada do paciente, quando necessária, deverá ser feita no hospital de apoio. Estas unidades obrigatoriamente terão que garantir a referência para um hospital de apoio.

A Unidade tipo IV é a unidade anexada a um hospital geral ou especializado, que realiza procedimentos clínico-cirúrgicos com internação e não faz parte da análise realizada no presente parecer.

Dessa forma, para cada tipo de unidade haverá um planejamento e programação de enfermagem distintos. Mesmo a unidade tipo I, deverá contar com instrumental e material de consumo adequadamente esterilizado, de acordo com as normas em vigor, além de material para a coleta de resíduos.

Esses serviços devem incluir em sua programação a prevenção da propagação de infecções e a segurança dos pacientes, a esterilização de material, administração de medicamentos, o acompanhamento e cuidados no transporte de pacientes, além de outros cuidados a depender da situação clínica do paciente.

Na esterilização de produtos de saúde, cabe aos enfermeiros planejar, coordenar, executar, supervisionar e avaliar todas as etapas relacionadas ao processamento de produtos para saúde, recepção, limpeza, secagem, avaliação da integridade e da funcionalidade, preparo, desinfecção ou esterilização, armazenamento e distribuição para as salas onde serão usados nos procedimentos médicos e cirúrgicos, garantindo que esses instrumentos sejam esterilizados e estão aptos para uso, conforme disciplinado pela Resolução Cofen nº 424/2012.

Na coordenação das atividades de enfermagem, o enfermeiro deverá elaborar o Protocolo Operacional Padrão (POP) para as etapas do processamento de produtos para saúde, com base em referencial científico atualizado e normatização pertinente, monitorar e controlar as etapas de limpeza e desinfecção ou esterilização, bem como a manutenção e monitoramento dos equipamentos em uso, utilizar indicadores de controle de qualidade do processamento de produtos para saúde, sob sua responsabilidade, definir critérios de utilização de materiais, tais como prazo, necessidade, ou não, de reprocessamento, entre outros.

Além das atividades acima, o enfermeiro deve participar das ações de prevenção e controle de eventos adversos no serviço de saúde, incluindo o controle de infecção. Promover capacitação, educação permanente e avaliação do serviço desempenhado pelos profissionais de enfermagem que atuam na clínica.

É importante destacar que essas clínicas possuem autorização para administrar medicamentos, anestesia local e até mesmo geral, com a permissão em proceder cirurgias de pequeno e médio porte, as quais são caracterizadas por atingir tecidos, de curta duração e que o tempo estimado de internação é de até 24 horas. Os medicamentos utilizados como anestésico podem ocasionar riscos e efeitos colaterais potenciais, com reações alérgicas.

Para cada procedimento médico, o paciente terá necessidades individualizadas e atividades de enfermagem diversas, sendo os enfermeiros responsáveis ​​por observar e monitorar continuamente o estado de saúde dos pacientes, acompanhando os sinais específicos, sintomas, resposta a tratamentos e quaisquer mudanças significativas em seu estado ou estabelecendo plano de cuidados para o técnico/auxiliar de enfermagem executar conforme sua orientação e supervisão. Essa avaliação constante permite a detecção precoce de problemas e a intervenção imediata.

Essas cirurgias geralmente envolvem procedimentos invasivos e os pacientes ainda precisam de atenção e cuidados adequados para evitar complicações e promover uma recuperação bem-sucedida.

Os enfermeiros, por meio da consulta de enfermagem (artigo 11, inciso I, alínea “i” da lei nº 7.498/86), devem monitorar regularmente os sinais específicos do paciente, incluindo frequência cardíaca, pressão arterial, respiração e temperatura para identificar qualquer sinal de complicações, o gerenciamento da dor pós-operatória do paciente, coletando os dados (histórico de enfermagem). Monitorar e avaliar o local da incisão cirúrgica quanto a sinais de infecção, hematoma, surto, ocorrência, cuidados com a ferida, entre outros. Com os dados coletados, o enfermeiro agrupa-os para selecionar as ações ou intervenções de enfermagem com as quais se objetiva alcançar os resultados esperados. Para tanto, deverá possuir conhecimentos de base científica e capacidade de tomar decisões imediatas (Resolução Cofen nº 358/2009).

Nos três tipos de unidades (I, II e III), em especial o II e III, deverá o serviço garantir a referência para um hospital de apoio para garantir o transporte inter-hospitalar dos pacientes entre unidades não hospitalares ou hospitalares de atendimento às urgências e emergências, terapêutica ou outras unidades de saúde que funcionem como bases de estabilização para pacientes graves, atentando-se que o tratamento seja imediato diante da necessidade de manter funções vitais e evitar incapacidade ou complicações graves (Resolução Cofen nº 713/2022).

Face às orientações e recomendações já descritas, compete ao profissional médico a indicação e solicitação da transferência de pacientes. Contudo, o Enfermeiro possui autonomia para planejar e organizar o transporte, informando ao médico responsável a evolução do paciente e se há contraindicações para iniciar o transporte naquele momento, já que o transporte deve garantir a segurança e a continuidade do cuidado de enfermagem ao paciente, faz-se essencial que esta atividade não agrave o seu estado de saúde e que seja organizado de forma a reduzir riscos de possíveis intercorrências e complicações (Resolução Cofen nº 713/2022).

Além das clínicas de atividade médica ambulatorial com recursos para realização de procedimentos cirúrgicos, há também a atividade médica ambulatorial com recursos para realização de exames complementares. Nessa classe pode-se caracterizar as clínicas de endoscopias, as quais são regulamentadas pela RESOLUÇÃO-RDC Nº 6, DE 1O DE MARÇO DE 2013, que dispõe sobre os requisitos de Boas Práticas de Funcionamento para os serviços de endoscopia com via de acesso ao organismo por orifícios exclusivamente naturais.

Nesses serviços também são incluídas as atividades de enfermagem em sua programação. Primeiramente sua classificação como serviço de saúde é certa, já que há a possibilidade de sedação dos pacientes assistidos, prevenção e controle de infecção, gerenciamento de resíduos, processo de limpeza, desinfecção, esterilização, armazenamento, transporte, funcionamento e manuseio dos equipamentos de saúde e acessórios, bem como atendimento de emergência. Por isso, deverão incluir a atividade de enfermagem e prescrição da assistência de enfermagem no seu planejamento e programação (art. 2 e 3 do Decreto nº 94.406/87).

Eis que devidamente observadas as complexidades técnicas no acompanhamento ao paciente, a lei do exercício profissional da enfermagem não permitiu que os auxiliares e técnicos de enfermagem prestassem os cuidados de enfermagem que exijam capacidade de tomar decisões imediatas, quando em seu artigo 11, inciso I, alíneas “l” e “m”, estabeleceu essas atividades como privativas do enfermeiro, senão vejamos:

 

“LEI nº 7.498/86

Dispõe sobre a regulamentação do exercício da Enfermagem e dá outras providências

[…]

Artigo 11° – O Enfermeiro exerce todas as atividades de Enfermagem, cabendo-lhe:

I – Privativamente:

[…]

l) Cuidados diretos de enfermagem a pacientes graves com risco de vida;

m) Cuidados de Enfermagem de maior complexidade técnica e que exijam conhecimentos de base científica e capacidade de tomar decisões imediatas;”

 

De acordo com a supracitada lei, o técnico e auxiliar de enfermagem somente realizam atividades de enfermagem quando de execução simples e de natureza repetitiva. Por isso, o Decreto Federal nº 94.406/87 que regulamenta a Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986, que dispõe sobre o exercício da Enfermagem, e dá outras providências, prevê:

 

“Artigo 10° – O Técnico de Enfermagem exerce as atividades auxiliares, de nível médio técnico, atribuídas à equipe de Enfermagem, cabendo-lhe:

I – Assistir ao Enfermeiro:

[…]

 

Artigo 11° – O Auxiliar de Enfermagem executa as atividades auxiliares, de nível médio atribuídas à equipe de Enfermagem, cabendo-lhe:

[…]

III – Executar tratamentos especificamente prescritos, ou de rotina, além de outras atividades de Enfermagem, tais como:

a) ministrar medicamentos por via oral e parenteral;

b) realizar controle hídrico;

c) fazer curativos;

d) aplicar oxigenoterapia, nebulização, enteroclisma, enema e calor ou frio;

e) executar tarefas referentes à conservação e aplicação de vacinas;

f) efetuar o controle de pacientes e de comunicantes em doenças transmissíveis;

g) realizar testes e proceder à sua leitura, para subsídio de diagnóstico;

h) colher material para exames laboratoriais;

i) prestar cuidados de enfermagem pré e pós-operatórios;

j) circular em sala de cirurgia e, se necessário, instrumentar;

l) executar atividades de desinfecção e esterilização;”

 

Além das clínicas médicas acima citadas, existem as de atividades de atenção ambulatorial não especificadas, tais como as que prestam serviços de quimioterapia. Nessas clínicas, os profissionais de enfermagem são peças-chaves na equipe multidisciplinar: eles acompanham o tratamento oncológico dos pacientes desde o seu início, sendo responsáveis por todo o processo de administração dos medicamentos. A equipe de enfermagem oncológica é qualificada tecnicamente para identificar qualquer sinal de reações medicamentosas durante a infusão, garantindo intervenções rápidas e assertivas.

Além de prestar assistência integral ao paciente, o enfermeiro oncologista também gerencia a agenda de tratamento quimioterápico, realiza consultas de enfermagem oncológica e tem papel educacional, orientando tanto o paciente quanto os familiares durante o tratamento.

Segundo a Portaria MS/SAS Nº 3.535/98 que estabelece critérios para cadastramento de centros de atendimento em oncologia, entre locais de assistência encontram-se os serviços de Oncologia Clínica, que devem contemplar os seguintes quesitos: anotar no prontuário, além do disposto no item 2.1 dessa Portaria, informações sobre a quimioterapia, o esquema terapêutico, a dosagem prescrita e aplicada em cada sessão.

As clínicas devem possuir uma rotina de funcionamento com procedimentos de enfermagem, condutas terapêuticas, avaliação da eficácia da quimioterapia, controle e atendimento de intercorrências e de internações, armazenamento, controle e preparo de soluções e quimioterápicos, procedimentos de biossegurança, acondicionamento e eliminação de resíduos de quimioterapia, manutenção de equipamentos, entre outros.

A saber, na Resolução Cofen nº 569/2018 enumera as competências privativas do Enfermeiro em quimioterapia antineoplásica: planejar, organizar, supervisionar, executar e avaliar todas as atividades de Enfermagem, em pacientes submetidos ao tratamento quimioterápico antineoplásico, categorizando-o como um serviço de alta complexidade; elaborar protocolos terapêuticos de Enfermagem na prevenção, tratamento e minimização dos efeitos colaterais; realizar consulta de enfermagem; ministrar quimioterápico antineoplásico, conforme farmacocinética da droga e protocolo terapêutico; promover acesso venoso totalmente implantável, etc.

“Em virtude disso, podemos selecionar para ilustrar as questões técnicas que envolvem a matéria aqui abordada a situação, por exemplo, de pacientes oncológicos que utilizam cateteres venosos centrais de longa permanência totalmente implantando por onde recebem tratamento quimioterápico, soros, antibióticos, sangue e seus derivados e por onde se realiza a coleta destinada à realização de exames laboratoriais, já que a rede venosa periférica desses pacientes não é mais acessível por inexistir permeabilidade necessária para proceder à punção.

Importante destacar, por oportuno, se o dispositivo for manipulado de forma inadequada poderá trazer complicações infecciosas e não infecciosas, tais como: relacionadas à punção, oclusão de cateter, trombose venosa profunda, necrose da pele, extrução do reservatório, fratura do cateter, migração da extremidade do cateter, entre outros.

No caso de ocorrência de complicações, mesmo que o paciente continue com vida, será submetido a um procedimento cirúrgico desnecessário que poderia ter sido evitado, acabará por ocasionar uma despesa pecuniária elevada para o sistema de saúde” (Parecer técnico UF nº 09/14).

No entanto, sabe-se que existem procedimentos mais complexos e mais simples na coleta de exames laboratoriais e administração de medicamentos. Mas, em todos os casos são necessários cuidados e orientações especiais, a exemplo da punção venosa periférica, classificada como simples e de acordo com a condição clínica do paciente o procedimento poderá necessitar de cuidados de enfermagem de maior complexidade técnica e que exijam conhecimentos científicos adequados e capacidade de tomar decisões imediatas.

Nesse diapasão, o Técnico de Enfermagem em serviços de quimioterapia antineoplásica, executam ações de Enfermagem a pacientes submetidos ao tratamento quimioterápico antineoplásico, sob a supervisão e prescrição do Enfermeiro, cumprindo os protocolos terapêuticos de Enfermagem.

Dessa forma, nas clínicas oncológicas o enfermeiro é parte integrante e essencial com atuação nos procedimentos complexos em paciente graves e com risco de vida como punção de acesso inclusive por cateter totalmente implantado, administração de quimioterápico, levando em consideração a segurança e a qualidade da assistência além de executar os protocolos terapêuticos de Enfermagem na prevenção, tratamento e minimização dos efeitos colaterais e riscos da administração dos quimioterápicos antineoplásicos (Resolução Cofen nº 569/2018).

Independentemente do tipo de serviço oferecido pela clínica, o estabelecimento de saúde incluirá atividades de enfermagem no seu planejamento e programação de atendimento, conforme disposto no art. 3º da lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986, e art. 2º do decreto nº 94.406, de 8 de junho de 1987. A prescrição da assistência de enfermagem é parte integrante do programa de enfermagem, sendo privativo do enfermeiro a realização do planejamento, organização, coordenação, execução e avaliação dos serviços da assistência de enfermagem prestada pela clínica (art. 11, inciso I, “c”, da lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986).

Desse modo, caberá à fiscalização dos Regionais inspecionar as clínicas, caracterizando o tipo de serviço prestado, exigindo enfermeiro responsável técnico para planejar, organizar, coordenar, executar e avaliar os serviços de Enfermagem ofertados, observando o exercício da enfermagem conforme os normativos legais, éticos e disciplinares da profissão.

 

2. Direito Privativo do Enfermeiro na Orientação e Supervisão do Trabalho de Enfermagem em Grau Auxiliar

 

No tocante à questão da supervisão, é essencial a análise da legislação de regência especial aplicável à atividade de enfermagem, qual seja, a Lei nº 7498/1986 e o Decreto nº 94 406/1987.

A Lei nº 7.498/1986, que dispõe sobre a regulamentação do exercício da enfermagem, elenca o rol de atribuições dos enfermeiros e dos auxiliares de enfermagem, destacando-se:

 

“Art 11. O Enfermeiro exerce todas as atividades de enfermagem, cabendo-lhe:

I – privativamente:

a) direção do órgão de enfermagem integrante da estrutura básica da instituição de saúde, publica e privada, e chefia de serviço e de unidade de enfermagem;

b) organização e direção dos serviços de enfermagem e de suas atividades técnicas e auxiliares nas empresas prestadoras desses serviços;

c) planejamento, organização, coordenação, execução e avaliação dos serviços da assistência de enfermagem;

[…]

Art. 12. O Técnico de Enfermagem exerce atividade de nível médio, envolvendo orientação e acompanhamento do trabalho de enfermagem em grau auxiliar, e participação no planejamento da assistência de enfermagem, cabendo-lhe especialmente:

a) participar da programação da assistência de enfermagem;

b) executar ações assistenciais de enfermagem, exceto as privativas do Enfermeiro, observado o disposto no parágrafo único do art. 11 desta lei;

c) participar da orientação e supervisão do trabalho de enfermagem em grau auxiliar;

d) participar da equipe de saúde.

Art. 13. O Auxiliar de Enfermagem exerce atividades de nível médio, de natureza repetitiva, envolvendo serviços auxiliares de enfermagem sob supervisão, bem como a participação em nível de execução simples, em processos de tratamento, cabendo-lhe especialmente:

a) observar, reconhecer e descrever sinais e sintomas;

b) executar ações de tratamento simples;

c) prestar cuidados de higiene e conforto ao paciente;

d) participar da equipe de saúde.

[…]

Art. 15. As atividades referidas nos arts. 12 e 13 desta lei, guando exercidas em instituições de saúde, públicas e privadas, e em programas de saúde, somente podem ser desempenhadas sob orientação e supervisão de Enfermeiro.” (grifamos).

 

O Decreto nº 94.406/1987, que regulamenta a Lei nº 7.498/1986, também dispõe acerca das atribuições dos enfermeiros e dos auxiliares de enfermagem, “in verbis”:

 

“Art 10. O Técnico de Enfermagem exerce as atividades auxiliares, de nível médio técnico, atribuídas a equipe de enfermagem, cabendo-lhe:

I – assistir ao Enfermeiro:

a) no planejamento, programação, orientação e supervisão das atividades de assistência de enfermagem;

b) na prestação de cuidados diretos de enfermagem a pacientes em estado grave;

c) na prevenção e controle das doenças transmissíveis em geral em programas de vigilância epidemiologica;

d) na prevenção e no controle sistemático da infecção hospitalar;

e) na prevenção e controle sistemático de danos físicos que possam ser causados a pacientes durante a assistência de saúde;

f) na execução dos programas referidos nas letras i e o do item II do art. 8°;

II – executar atividades de assistência de enfermagem, excetuadas as privativas do enfermeiro e as referidas no art. 9° deste Decreto;

III – integrar a equipe de saúde

Art. 11. O Auxiliar de Enfermagem executa as atividades auxiliares, de nível médio, atribuídas a equipe de enfermagem, cabendo-lhe:

I – preparar o paciente para consultas, exames e tratamentos;

II – observar, reconhecer e descrever sinais e sintomas, ao nível de sua qualificação;

III – executar tratamentos especificamente prescritos, ou de rotina, alem de outras atividades de enfermagem, tais como:

a) ministrar medicamentos por via oral e parenteral;

b) realizar controle hídrico,

c) fazer curativos;

d) aplicar oxigenoterapia, nebulização, enteroclisma, enema e calor ou frio;

e) executar tarefas referentes a conservação e aplicação de vacinas;

f) efetuar o controle de pacientes e de comunicantes em doenças transmissíveis;

g) realizar testes e proceder a sua leitura, para subsídio de diagnóstico;

h) colher material para exames laboratoriais;

i) prestar cuidados de enfermagem pré e pós-operatórios;

j) circular em sala de cirurgia e, se necessário, instrumentar;

1) executar atividades de desinfecção e esterilização;

IV – prestar cuidados de higiene e conforto ao paciente e zelar por sua segurança, inclusive:

a) alimentá-lo ou auxiliá-lo a alimentar-se;

b) zelar pela limpeza e ordem do material, de equipamentos e de dependências de unidades de saúde;

V – integrar a equipe de saúde;

VI – participar de atividades de educação em saúde, inclusive:

a) orientar os pacientes na pós-consulta, quanto ao cumprimento das prescrições de enfermagem e médicas;

b) auxiliar o Enfermeiro e o Técnico de Enfermagem na execução dos programas de educação para a saúde;

VII – executar os trabalhos de rotina vinculados a alta de pacientes;

VIII – participar dos procedimentos pós-morte.

[…]

Art. 13. As atividades relacionadas nos arts. 10 e 11 somente poderão ser exercidas sob supervisão, orientação e direção de Enfermeiro. (grifamos).

 

Ora, de acordo com as regras dispostas nos dispositivos legais acima transcritos, as atividades desenvolvidas por técnico e auxiliar de enfermagem objetivam dar suporte e auxiliar o profissional enfermeiro no desenvolvimento de suas atividades, por essa razão devem ser desenvolvidas sob sua orientação e supervisão direta.

Ademais, resta evidente que o fim precípuo das normas supra mencionadas é assegurar que os postos de enfermagem tenham a supervisão de profissional apto a orientar os atendimentos aos pacientes. Este também é o entendimento consolidado nos Egrégios Tribunais Regionais Federais, notem:

 

“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – INTERESSE PROCESSUAL – HOSPITAL – EXIGÊNCIA DE ENFERMEIRO: OBRIGATORIEDADE (ART. 11, I, “A”, DA LEI N° 7.498/86).

1. Se há, em tese, direito lesionado da parte, configurado está seu interesse processual, justificando o pronunciamento jurisdicional de mérito.

2. A jurisprudência do STJ afirma que “a direção do posto de enfermagem de hospital público é cargo privativo de enfermeiro qualificado. A determinação legal tem, por escopo assegurar a supervisão do setor de enfermagem profissional habilitado para melhor orientar o atendimento aos pacientes” (REsp n° 438673/MG, Rei. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ de 03/05/2006).

3. Exige-se enfermeiro formado contratado para o posto de direção de enfermagem em período integral de funcionamento – de cada unidade do hospital, para assegurar tjue cada posto de enfermagem tenha como supervisor um profissional melhor qualificado, apto a orientar os atendimentos aos pacientes.

4. Os conselhos profissionais não têm apenas competência para fiscalizar os inscritos em seus quadros, mas, também, a defesa da sociedade, fiscalizando e punindo instituições que não apresentem profissionais habilitados para o exercício da profissão. A fiscalização, então, se mostra necessária aos interesses da comunidade.

5. Apelação provida: sentença cassada. No mérito (CPC, art. 515, §3°), pedido improcedente.

6. Peças liberadas pelo Relator em 02/02/2009, para publicação do acórdão.”

 

(AC 2003.38. 00. 056214-2/MG, Rei. Desembargador Federal Luciano Tolentino Amaral, Sétima Turma, e- DJFl p.667 de 13/02/2009) (grifamos)

 

No mesmo sentido, confira-se, ainda, julgados do colendo Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

 

“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL. HOSPITAL. SANTA CASA. POSTOS DE ENFERMAGEM. DIREÇÃO POR ENFERMEIRO CONTRATADO. OBRIGATORIEDADE. LEIN° 7.498/86. PRECEDENTES.

1. Agravo regimental contra decisão que desproveu agravo de instrumento.

2. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que: – “consoante entendimento deste STJ, a direção do posto de enfermagem de hospital público é cargo privativo de enfermeiro qualificado. A determinação legal tem por escopo assegurar a supervisão do setor de enfermagem profissional habilitado para melhor orientar o atendimento aos pacientes” (REsp n° 438673/MG, Rel. Mm. Francisco Peçanha Martins, DJ de 03/05/2006) ;”a Lei n° 7.498/86 dá ênfase a necessidade do órgão de direção da unidade de enfermagem ser dirigido por profissional enfermeiro, afirmando que compete privativamente ao enfermeiro a chefia da unidade de enfermagem (art. 11, me. I, letra “a”). A lei classificou as atividades dos técnicos e dos auxiliares de enfermagem como subsidiárias, de nível médio, ou, na letra da lei, de acompanhamento do trabalho de enfermagem em grau auxiliar (para os técnicos – art. 12} ou de natureza repetitiva, envolvendo serviços auxiliares de enfermagem sob supervisão (para os auxiliares – art. 13). O objetivo da Lei n° 7.498/86 e o de assegurar que cada posto de enfermagem tenha como supervisor um profissional melhor qualificado, apto a orientar os atendimentos aos pacientes” (REsp n° 477373/MG, Rei. Mm. Francisco Falcão, DJ de 15/12/2003) .

3. Agravo regimental não-provido.”

 

(AgRg no Ag 938.749/SP, Rei. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/02/2008, DJe 03/03/2008) (grifamos)

 

“ADMINISTRATIVO. HOSPITAL PUBLICO. DIREÇÃO DOS POSTOS DE ENFERMAGEM POR PROFISSIONAL ENFERMEIRO. OBRIGATORIEDADE. ARTIGO 11, INCISO I, LETRAS “A”, “B” E “C”, E ARTIGO 15, TODOS DA LEI N° 7.498/86.

I – A Lei nº 7. 498/86 dá ênfase a necessidade do órgão de direção da unidade de enfermagem ser dirigido por profissional enfermeiro, afirmando que compete privativamente ao enfermeiro a chefia da unidade de enfermagem (art. 11, inc. I, letra “a”). A lei classificou as atividades dos técnicos e dos auxiliares de enfermagem como subsidiárias, de nível médio, ou, na letra da lei, de acompanhamento do trabalho de enfermagem em grau auxiliar (para os técnicos – art. 12) ou de natureza repetitiva, envolvendo serviços auxiliares de enfermagem sob supervisão (para os auxiliares – art. 13).

II – O objetivo da Lei n° 7.498/96 é o de assegurar que cada posto de enfermagem tenha como supervisor um profissional melhor qualificado, apto a orientar os atendimentos aos pacientes.

III- Recurso especial parcialmente provido para determinar a Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais que, observado o quadro de enfermeiros da instituição, dê preferência dos cargos de direção/supervisão/chefia de seus postos de enfermagem a profissionais enfermeiros, durante as vinte e quatro horas do dia ou enquanto estiverem em funcionamento.”

 

(REsp 477373/MG, Rei Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28/10/2003, DJ 15/12/2003 p 195) (grifamos)

 

Há de se ponderar, ainda, que a matéria que ora se discute, essencialmente, deve ser tratada com vistas à preservação de uma garantia fundamental tutelada pelo texto magno, relativa ao direito à saúde, ontologicamente ligada à garantia, também fundamental, do direito à vida.

Nesta esteira, é duvidosa a validade do Parecer CFM nº 16/2012[1], pois carece de respaldo na Lei n° 7.498/1986, uma vez que incabível modificar disposições expressas de texto legislativo ou criar novas exigências onde a lei não estabelece.

Por tudo isto, entende-se por necessária a presença de enfermeiro em clínicas médicas para o planejamento, execução e avaliação da assistência prestada por profissionais de enfermagem, de forma ininterrupta, durante o funcionamento da respectiva clínica, a fim de organizar e orientar as atividades de enfermagem ali desenvolvidas, inclusive por técnicos e auxiliares de enfermagem.

Nesse sentido foi a sentença exarada no processo nº 46386-88.2012.4.01.3400 em curso na 22ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, que tem como impetrante, o Conselho Regional de Enfermagem do Distrito Federal, e como impetrado, o Presidente do Conselho Federal de Medicina. Eis a sua parte dispositiva:

 

“Ex positis, resolvo o mérito da presente ação (art. 269, inciso I, CPC), para CONCEDER a segurança pleiteada pelo CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DO DISTRITO FEDERAL para reconhecer o direito privativo do Enfermeiro na orientação e supervisão do trabalho de Enfermagem em grau auxiliar, nos termos da fundamentação.”

 

III. CONCLUSÃO

 

Diante do exposto, nosso posicionamento acerca dos assuntos trazidos é de que existem competências específicas relativas às atividades de enfermagem, que guardam complexidades técnicas no acompanhamento do paciente, o que torna obrigatória a presença do enfermeiro em clínicas médicas. É importante esclarecer que o rol de clínicas apontado no presente parecer é exemplificativo, para isso é importante ao fiscal  descrever as características do serviço conforme orientação deste documento.

 

 

Brasília-DF, 11 de setembro de 2023.

 

 

 

Tatiana Maria Melo Guimarães

Conselheira Federal
Tycianna Goes da Silva Monte Alegre

Procuradora-Geral do Cofen
Graziela Pontes Cahu

Chefe da Fiscalização do Coren-PB
Laise Ellen Santos da Silva Fernandes

Assessora Jurídica do Coren-PE
Roberto Martins de Alencar Nogueira

Procurador do Cofen

Fonte: https://www.cofen.gov.br/parecer-de-conselheira-federal-no-11-2023-proger-dpac-spc-cofen/

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