PARECER DE CÂMARA TÉCNICA Nº 006/2017/CTAS/COFEN

Parecer sobre a inclusão de procedimento eletivo de sangria terapêutica em Pronto Atendimento Infantil

04.07.2017

PARECER DE CÂMARA TÉCNICA Nº 006/2017/CTAS/COFEN

INTERESSADO: Coren-AP
REFERÊNCIA: PAD Cofen N° 0304/2017

Sangria terapêutica em Pronto Atendimento Infantil

 

I— DA CONSULTA

Trata-se do PAD Cofen no. 0304/2017, encaminhado pelo Sr. Mauro Ricardo Antunes Figueiredo, chefe de gabinete da Presidência do Cofen, à Câmara Técnica de Atenção à Saúde-CTAS, para emissão de parecer a respeito da inclusão do procedimento eletivo de sangria terapêutica na rotina do Pronto Atendimento Infantil – PAI, demanda encaminhada pelo Presidente do Coren-AP, o Dr. Antônio Marcos Freire Gomes, após encaminhamento de um despacho do Departamento de Fiscalização, contendo uma solicitação da Presidente da Comissão de Ética de Enfermagem do Hospital da Criança e do Adolescente e Pronto Atendimento Infantil (CEE/HCAIPAI), sobre o assunto em epígrafe. Compõem os autos processuais os seguintes documentos: a) Ofício n. 134/2017 – Gab. Presidência/COREN AP; b) Despacho do Processo Administrativo n° P2017000430, com a referida solicitação; c) Despacho 1528/2017 GAB/PRES, com encaminhamento da matéria à CTAS.

 

II— DO HISTÓRICO DOS FATOS

Em 15 de março de 2017, a Dra. Maria Ester da Silva, Chefe do Departamento de Fiscalização, encaminhou à Presidência do Coren-AP, esclarecimentos a respeito da inclusão do procedimento de sangria terapêutica, no entendimento do departamento de Fiscalização. A Presidência do Coren-AP solicitou ao Cofen, em 24 de março de 2017, a manifestação da Câmara Técnica de Atenção à Saúde-CTAS sobre o assunto, recebida pelo Cofen em 18 de abril de 2017, que de fato, encaminhou à CTAS, recebendo esta, no dia 26 de abril de 2017.

 

III – DA ANÁLISE TÉCNICA

A sangria terapêutica é um procedimento semelhante à doação de sangue, com a diferença de que o sangue é desprezado após a coleta. Esta terapia é indicada mais frequentemente a pacientes portadores de hemocromatose, policitemia vera e poliglobulia, o principal objetivo é controlar o aumento da viscosidade sanguínea nas eritrocitoses (excesso de glóbulos vermelhos). Ao receber a solicitação de sangria terapêutica, o médico do banco de sangue avalia o paciente. A cada sangria, são coletados 500 ml de sangue, volume este que, de acordo com a condição clínica do paciente, é reposto pelo volume equivalente de soro fisiológico. O número e o intervalo entre os procedimentos variam, pois dependem da doença de base, da condição clínica do paciente e da resposta ao tratamento. A indicação, volume a ser retirado e a frequência são definidos pelo médico assistente em conjunto com o hematologista-hemoterapeuta, sempre considerando o diagnóstico, os testes laboratoriais, os sintomas e eventuais reações adversas em sangrias anteriores. É um procedimento simples e seguro, mas eventualmente o paciente pode manifestar reações adversas (Albert Einstein SBIB, 2017; INGOH, 2017).

Destacamos que para fundamentar este parecer técnico, e considerando que se trata de inclusão de procedimento em protocolos institucionais, elencamos as seguintes citações à legislação:

1. Constituição Federal – Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos em seu artigo 5°, inciso XIII, a saber:

“É livre o exercício de qualquer trabalho, oficio ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer.”

2. Lei n° 7498/86 que dispõe sobre a regulamentação do exercício da Enfermagem, e dá outras providências, a saber:

Em seu artigo

11. O Enfermeiro exerce todas as atividades de enfermagem, cabendo-lhe:

1- privativamente: a) direção do órgão de enfermagem integrante da estrutura básica da instituição de saúde, pública e privada, e chefia de serviço e de unidade de enfermagem;

b) organização e direção dos serviços de enfermagem e de suas atividades técnicas e auxiliares nas empresas prestadoras desses serviços;

c) planejamento, organização, coordenação, execução e avaliação dos serviços da assistência de enfermagem; (..)

h) consultoria, auditoria e emissão de parecer sobre matéria de enfermagem;

i) consulta de enfermagem,

j) prescrição da assistência de enfermagem, (..)

m) cuidados de enfermagem de maior complexidade técnica e que exijam conhecimentos de base científica e capacidade de tomar decisões imediatas;

II- como integrante da equipe de saúde: a) participação no planejamento, execução e avaliação da programação de saúde,

b) participação na elaboração, execução e avaliação dos planos assistenciais de saúde;

c) prescrição de medicamentos estabelecidos em programas de saúde pública e em rotina aprovada pela instituição de saúde.

f) prevenção e controle sistemático de danos que possam ser causados à clientela durante a assistência de enfermagem, (…)

E em seu Art. 12. O Técnico de Enfermagem exerce atividade de nível médio, envolvendo orientação e acompanhamento do trabalho de enfermagem em grau auxiliar, e participação no planejamento da assistência de enfermagem, cabendo-lhe especialmente: a) participar da programação da assistência de enfermagem; b) executar ações assistenciais de enfermagem, exceto as privativas do Enfermeiro, observado o disposto no parágrafo único do art. 11 desta lei c) participar da orientação e supervisão do trabalho de enfermagem em grau auxiliar; d) participar da equipe de saúde (grifos nossos).

O Art. 13. O Auxiliar de Enfermagem exerce atividades de nível médio, de natureza repetitiva, envolvendo serviços auxiliares de enfermagem sob supervisão, bem como a participação em nível de execução simples, em processos de tratamento, cabendo-lhe especialmente: a) observar, reconhecer e descrever sinais e sintomas; b) executar ações de tratamento simples; c) prestar cuidados de higiene e conforto ao paciente; d) participar da equipe de saúde.

O Art. 15. As atividades referidas no art. 12 (…) desta lei, quando exercidas em instituições de saúde, públicas e privadas, e em programas de saúde, somente podem ser desempenhadas sob orientação e supervisão de Enfermeiro. (Grifos nossos).

3. Decreto n° 94.406/87 que Regulamenta a Lei n° 7.498, de 25 de junho de 1986, que dispõe sobre o exercício da Enfermagem e dá outras providências, a saber:

Art. 8°Ao Enfermeiro Incumbe,

II- como integrante de equipe de saúde:
a) participação no planejamento, execução e avaliação da programação de saúde,
b) participação na elaboração, execução e avaliação dos planos assistenciais de saúde, (..)
f) participação na elaboração de medidas de prevenção e controle sistemático de danos que possam ser causados aos pacientes durante a assistência de enfermagem, (..)
i) participação nos programas e nas atividades de assistência integral à saúde individual e de grupos específicos, particularmente daqueles prioritários e de alto risco; (..)

E em seu Art. 10 – O Técnico de Enfermagem exerce as atividades auxiliares, de nível médio técnico, atribuídas à equipe de Enfermagem, cabendo-lhe: I – assistir ao Enfermeiro: a) no planejamento, programação, orientação e supervisão das atividades de assistência de Enfermagem; b) na prestação de cuidados diretos de Enfermagem a pacientes em estado grave; ( … )

Art. 11. O Auxiliar de Enfermagem executa as atividades auxiliares, de nível médio, atribuídas à equipe de enfermagem, cabendo-lhe:
I -preparar o paciente para consultas, exames e tratamentos,
II- observar, reconhecer e descrever sinais e sintomas, ao nível de sua qualificação,
III – executar tratamentos especificamente prescritos, ou de rotina, além de outras atividades de enfermagem, tais como:
a) ministrar medicamentos por via oral e parenteral;b) realizar controle hídrico;c) fazer curativos,d) aplicar oxigenoterapia, nebulização, enteroclisma, enema e calor ou frio;e) executar tarefas referentes à conservação e aplicação de vacinas, f) efetuar o controle de pacientes e de comunicantes em doenças transmissíveis, g) realizar testes e proceder à sua leitura, para subsídio de diagnóstico, (..)
IV – prestar cuidados de higiene e conforto ao paciente e zelar por sua segurança, inclusive:a) alimentá-lo ou auxiliá-lo a alimentar-se,b) zelar pela limpeza e ordem do material, de equipamentos e de dependências de unidades de saúde,
V- integrar a equipe de saúde,
VI-participar de atividades de educação em saúde, inclusive: (..) b) auxiliar o Enfermeiro e o Técnico de Enfermagem na execução dos programas de educação para a saúde;
VIII – participar dos procedimentos pós-morte.

Art. 13: As atividades relacionadas nos art. 10 e 11 somente poderão ser exercidas sob supervisão, orientação e direção de Enfermeiro (Grifos Nossos)

4. Resolução Cofen 311/2007, que aprova a Reformulação do Código de Ética dos profissionais de Enfermagem, a saber:

Seções I, II e IV – Das Responsabilidades e Deveres ( … )

Art. 12 – Assegurar à pessoa, família e coletividade assistência de enfermagem livre de danos decorrentes de imperícia, negligência e imprudência; ( … )

Art. 21 – Proteger a pessoa, família e coletividade contra danos decorrentes de imperícia, negligência ou imprudência por parte de qualquer membro da equipe de saúde; ( … )

Art. 36- Participar da prática profissional multi e interdisciplinar com responsabilidade, autonomia e liberdade; ( … )

5. Resolução Cofen n° 358/2009, que dispõe sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem e a implementação do Processo de Enfermagem em ambientes, públicos ou privados, em que ocorre o cuidado profissional de Enfermagem, e dá outras providências. A saber:

Art. 1° O Processo de Enfermagem deve ser realizado, de modo deliberado e sistemático, em todos os ambientes, públicos ou privados, em que ocorre o cuidado profissional de Enfermagem; (..)

Art. 3º O Processo de Enfermagem deve estar baseado num suporte teórico que oriente a coleta de dados, o estabelecimento de diagnósticos de enfermagem e o planejamento das ações ou intervenções de enfermagem; e que forneça a basç para a avaliação dos resultados de enfermagem alcançados; (…)

Art. 4° Ao enfermeiro, observadas as disposições da Lei no 7.498, de 25 de junho de 1986 e do Decreto n° 94406 de 08 de junho de 1987, que a regulamenta, incumbe a liderança na execução e avaliação do Processo de Enferagem, de modo a alcançar os resultados de enfermagem esperados, cabendo-lhe, priva tivamente, o diagnóstico de enfermagem acerca das respostas da pessoa, família ou coletividade humana em um dado momento do processo saúde e doença, bem como a prescrição das ações ou intervenções de enfermagem a serem realizadas, face a essas respostas. (Grifos Nossos).

6. Resolução Cofen 389/2011, que atualiza, no âmbito do Sistema Cofen /Conselhos Regionais de Enfermagem, os procedimentos para registro de título de pós-graduação lato e stricto sensu concedido a enfermeiros e lista as especialidades. Em seu anexo, item:

13: Enfermagem em Hematologia e Hemoterapia

7. Resolução Cofen 511/2016, aprova a Norma Técnica que dispõe sobre a atuação de Enfermeiros e Técnicos de Enfermagem em Hemoterapia.

Art. 2° Cabe aos Conselhos Regionais adotar as medidas necessárias para fazer cumprir esta Norma, visando à segurança do paciente, dos profissionais envolvidos nos procedimentos de Enfermagem em Hemoterapia e dos doadores, relacionados à captação, triagem, coleta, distribuição, armazenamento e administração de Hemoderivados e Hemocomponentes;

Art. 5º. Os Enfermeiros e Técnicos de Enfermagem somente poderão atuar nos Serviços de Hemoterapia, desde que devidamente capacitados.

Em destaque para o conceito de protocolo, presente no anexo desta Resolução: Protocolo: conjunto de regras escritas definidas para a realização de determinado procedimento. Considerando ainda que de modo geral, compete ao Enfermeiro cuidados de. Enfermagem de maior complexidade técnica e que exijam conhecimentos científicosadequados e capacidade de tomar decisões imediatas.

8. Lei N° 12.842, de 10 de Julho de 2013, que dispõe sobre o exercício da Medicina

Art. 4º. São atividades privativas do médico. (..) III – indicação da execução e execução de procedimentos invasivas, sejam diagnósticos, terapêuticos ou estéticos, incluindo Om acessos vasculares profundos, as biópsias e as endoscopias. (…)

§ 4º Procedimentos invasivos, para os efeitos desta Lei, são os caracterizados por quaisquer das seguintes situações.(…)

II – invasão dos orifícios naturais do corpo, atingindo órgãos internos.

§ 5º Excetuam-se do rol de atividades privativas do médico: ( … ) IX – procedimentos realizados através de orifícios naturais em estruturas anatômicas visando à recuperação físico-funcional e não comprometendo a estrutura celular e tecidual. (grifos nossos).

§ 7º O disposto neste artigo será aplicado de forma que sejam resguardadas as competências próprias das profissões de assistente social, biólogo, biomédico, enfermeiro, farmacêutico, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, nutricionista, profissional de educação física, psicólogo, terapeuta ocupacional e técnico e tecnólogo de radiologia.

9. RDC 0 34 de 11 de junho de 2014, que diz no seu Art. 1º:

“Fica aprovado o Regulamento Sanitário que estabelece os requisitos de boas práticas para serviços de hemoterapia que desenvolvam atividades relacionadas ao ciclo produtivo do sangue e para serviços de saúde que realizem procedimentos transfusionais, incluindo captação de doadores, coleta, processamento, testagem, controle de qualidade e proteção ao doador e ao receptor, armazenamento, distribuição, transporte e transfusão em todo o território nacional.”

Art. 140. O serviço de hemoterapia deve estabelecer protocolos, de acordo com as determinações do Ministério da Saúde, para realização de:

(…)
VII – sangria terapêutica (Grifos nossos).

10. Parecer COREN – BA N° 009/2013, sobre a realização de sangria terapêutica e hemodiluição pela enfermagem, onde concluem: a. Enfermeiros e Técnicos de Enfermagem possuem competência técnica e legal para realizar o procedimento Sangria Terapêutica. Os Técnicos de Enfermagem, durante a realização do procedimento, deverão estar sob a supervisão direta do Enfermeiro. Sugere a elaboração de protocolo de conduta técnica (passo a passo) especificando as atribuições e responsabilidades da equipe assistencial na realização deste procedimento.

 

III – DO PARECER

Diante do exposto, destacamos que o procedimento de sangria terapêutica, não se configura como procedimento de alta complexidade, apresentando raros efeitos colaterais, e não há impeditivo legal para sua realização por profissionais de enfermagem.

Destacamos outrossim, que deve ser considerado sobretudo a complexidade do paciente. Diante da assistência a pacientes graves, nos inclina a esclarecer que esta é uma atividade que deve ser realizada privativamente pelo Enfermeiro. Não devendo estes, delegar esta atividade aos profissionais de enfermagem de nível médio. Devem ainda, estar aptos a realiza-lo após comprovada qualificação e/ou experiência na realização do procedimento. Deve utilizar a Sistematização da Assistência de Enfermagem para o cuidado aos pacientes, elaborar protocolos que descrevam detalhadamente o rito do procedimento. Do forma a estimular as boas práticas, acreditamos que a elaboração deste protocolo tenha a participação. de enfermeiro especialista em hematologia e hemoterapia. Por último, deve comunicar as autoridades competentes, quando houver déficit de profissionais e/ou profissionais desqualificados para a prática em tela.

A CTAS/COFEN corrobora com a importância do procedimento de sangria terapêutica compor protocolos institucionais.

É o parecer, salvo melhor juízo.

Brasília, 23 de maio de 2017.

Parecer elaborado por: Dr. José Gilmar Costa de Souza Júnior – COREN-PE n° 120107, Dra. Silvia Maria Neri Piedade- COREN-RO n° 92.597-Coordenadora; Dr. Ricardo Costa de Siqueira Coren-CE n° 65.918; Dra. Maria Alex Sandra Costa Lima Leocádio- COREN-AM n° 101.269; Dra. Carmen Lupi Monteiro Garcia COREN RJ n° 13922. Na 19ª Reunião Ordinária da CTAS.

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