POSIÇÃO DO CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM
SOBRE O PROJETO DE LEI – 200/2015


21.10.2015

INTRODUÇÃO

O Sistema CEP/CONEP tem por objetivo proteger os participantes de pesquisa em seus direitos e assegurar que as pesquisas sejam realizadas com ética no Brasil.

A RESOLUÇÃO CNS Nº 441, DE 12 DE MAIO DE 2011 considerando a necessidade de atualizar a complementação da regulamentação da Resolução CNS no 196/96 no que diz respeito ao armazenamento e à utilização de material biológico humano com finalidade de pesquisa; considerando a importância da utilização de material biológico humano para o desenvolvimento das ciências da saúde; considerando os subsídios advindos do Sistema EP/CONEP e a experiência acumulada na análise dos projetos de pesquisas que envolvem material biológico humano; considerando a necessidade de ser observada a proteção dos Direitos Humanos, das liberdades fundamentais e do respeito à dignidade humana na coleta, depósito, armazenamento, utilização e descarte de material biológico humano.

O coordenador da Comissão Nacional de Ética e Pesquisa (Conep/CNS), Jorge Venâncio, lançou apelo ao Cofen e às entidades da área de Saúde para que se manifestassem sobre o projeto. Em visita à plenária do Cofen, em junho, Venâncio destacou o “risco eminente à vida dos pacientes” representado pela liberação do uso de placebo (falso medicamento sem efeito real), um dos pontos polêmicos do projeto. Atualmente, os novos medicamentos são comparados ao melhor tratamento previamente existente.

FUNDAMENTAÇÃO E ANÁLISE

Hoje, o Sistema CEP/CONEP (Resolução CNS 466/12) tem por objetivo proteger os sujeitos participantes das pesquisas em seus direitos e assegurar que as pesquisas sejam realizadas de acordo com princípios éticos no Brasil.

O Projeto de Lei 200/2015 (PL), tramitando no Senado, poderá colocar em risco os direitos dos sujeitos da pesquisa, conquistados nas últimas décadas, ao longo da história do Sistema CEP/CONEP e do Conselho Nacional de Saúde.

São apresentados alguns pontos, para reflexão, sobre o PL-200/2015: a) Perda do direito ao medicamento após o estudo. Como é agora: se o uso do medicamento, durante o estudo, mostrar benefício aos participantes da pesquisa, o patrocinador deve fornecer o medicamento de forma gratuita, pelo tempo que for necessário, mesmo tendo encerrado o estudo (Resolução CNS 466/12. Qual é a proposta do PL-200: após o fim do estudo, o participante da pesquisa só tem direito ao medicamento em casos excepcionais. O patrocinador se obriga a dar o medicamento após o estudo apenas na seguinte situação: se a interrupção do medicamento implicar risco de morte ou piora relevante do estado de saúde e que, também, não haja alternativa de tratamento no Brasil. Fora isso, o PL não prevê obrigação do patrocinador continuar fornecendo o medicamento do estudo em caso de benefício à saúde dos participantes da pesquisa (Art. 28). Consequências da aprovação do PL-200: os participantes da pesquisa perderiam o direito de receber o medicamento após o estudo, mesmo que esteja trazendo benefício à sua saúde. Apenas em casos excepcionais, o patrocinador ficaria obrigado a dar o medicamento após o estudo. Quem sai perdendo seria o participante, que se submeteria a uma pesquisa, não isenta de riscos, e não teria garantido seu direito de receber o medicamento que lhe trouxe benefício.

  1. b) Uso indiscriminado de placebo. Como é agora: o placebo não contém o princípio ativo do medicamento. Às vezes é usado em pesquisas por questões científicas. O Conselho Nacional de Saúde e o Conselho Federal de Medicina permitem o uso de placebo em pesquisas científicas no Brasil, desde que não haja tratamento disponível para determinada doença (Resolução CNS 466/12 – item III.3.b, Código de Ética Médica, Art. 106). O Código de Ética Médica do Conselho Federal de Medicina proíbe os médicos brasileiros de participarem de estudos com placebo quando há tratamento disponível para uma doença. Qual a proposta do PL-200: se houver justificativa científica, o placebo pode ser usado em pesquisas, mesmo quando há tratamento conhecido para uma doença (Art. 27). Consequências da aprovação do PL-200: como o PL permite o uso de placebo quando houver justificativa científica, na prática isso significaria a liberação total do uso de placebos em pesquisa. Quase sempre é possível justificar cientificamente o uso de placebo, mas raramente há justificativa ética para o seu uso. Em outras palavras, o PL permitiria a inclusão de indivíduos doentes em uma pesquisa sem oferecer tratamento mesmo quando este estivesse disponível. Poderia haver uso indiscriminado de placebo, colocando em risco a saúde dos indivíduos. Quem perderia com a liberação irrestrita do uso de placebo, novamente, são os participantes da pesquisa.
  2. c) Extinção do sistema CEP/CONEP. Como é agora: o sistema de análise ética é formado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa – CONEP (sediada em Brasília) e quase 700 Comitês de Ética em Pesquisa (CEP) espalhados pelo país. O Sistema CEP/CONEP está em constante evolução e aprimoramento, sendo fruto de quase 20 anos de discussão no Conselho Nacional de Saúde (Resolução CNS 466/12, itens VII e VII.5). Qual a proposta do PL-200: o PL ignora a existência da CONEP, uma comissão do Conselho Nacional de Saúde/Ministério da Saúde, passando o controle da ética em pesquisa para as autoridades sanitárias do país. Consequências da aprovação do PL-200: desapareceria o Sistema CEP/CONEP e, consequentemente, todas as normas emitidas pelo Conselho Nacional de Saúde referentes a ética em pesquisa. Com isso, não haveria mais o controle social da pesquisa com seres humanos no Brasil. Quem sairia perdendo é a sociedade, por não ter mais em suas mãos o controle da análise ética das pesquisas.
  3. d) Fim da independência dos Comitês de Ética em Pesquisa (CEP). Como é agora: o registro e funcionamento dos Comitês de Ética em Pesquisa (CEP) são normatizados pelo Conselho Nacional de Saúde (Resolução CNS 466/12, Resolução CNS 370/07, Norma Operacional CNS 001/13). Esta normatização garante aos Comitês de Ética em Pesquisa independência quanto às suas decisões em relação à análise ética dos estudos, sem interferências externas, como por exemplo, dos pesquisadores e diretores das instituições. Seus membros desempenham trabalho voluntário, de relevância pública. Qual a proposta do PL-200: o PL não determina como serão regulados os Comitês de Ética em Pesquisa. Além do mais, os próprios pesquisadores proponentes poderão participar das reuniões dos Comitês de Ética como ouvintes. Consequências da aprovação do PL-200: os Comitês de Ética em Pesquisa perderiam sua independência, já que não haveria mais normatização para o registro e manutenção dos mesmos. Haveria risco de modificações ou substituição do CEP toda vez que alguma deliberação do CEP desagradar à direção da instituição. Além do mais, a presença dos pesquisadores nas reuniões do Comitê de Ética, durante as discussões éticas, tenderia a inibir decisões que desagradem os proponentes.
  4. e) Criação de Comitês de Ética subordinados a empresas. Como é agora: os Comitês de Ética em Pesquisa são vinculados a alguma instituição (principalmente Universidades, Hospitais e Secretarias de Saúde), sendo registrados e supervisados pela CONEP. Cabe às instituições fornecerem a infraestrutura necessária ao funcionamento dos comitês (Resolução CNS 466/12, itens VII.2 e VII.5). Qual a proposta do PL-200: o PL cria dois tipos de Comitês de Ética: o Institucional e o Independente (Art. 2º, incisos VII e VIII). Os Comitês de Ética Independentes não teriam laços institucionais, sendo sua existência vinculada a recursos financeiros próprios ou externos. Consequências da aprovação do PL-200: as indústrias, os pesquisadores ou as associações poderiam criar seus próprios Comitês de Ética Independentes para análise ética de suas pesquisas, ou apoiar financeiramente algum deles, o que representaria um enorme conflito de interesse (análise ética versus interesses financeiros). Quem sairia perdendo é o participante da pesquisa, que poderia se expor a pesquisas avaliadas por um Comitê de Ética Independente cujos interesses seriam guiados por aspectos financeiros, e não propriamente pela proteção do indivíduo em seus direitos e integridade.
  5. f) Fim da representação dos usuários nos Comitês de Ética. Como é agora: todo CEP tem em sua composição os chamados “representantes dos usuários”, os quais têm a visão dos participantes da pesquisa, defendendo os seus interesses (Resolução CNS 240/97, Norma Operacional CNS 001/2013, itens 2.B, 2.B.1). É o laço mais importante do controle social nos Comitês de Ética em Pesquisa. Qual a proposta do PL-200: embora o PL-200 diga que o Comitê de Ética deva ter composição multidisciplinar, o documento ignora completamente a existência dos representantes dos usuários. Consequências da aprovação do PL-200: desapareceriam os representantes dos usuários no sistema de análise ética. Tal perda enfraqueceria o controle social da pesquisa no Brasil, com consequentes perdas para o sistema de análise ética. A sociedade é que perderia.
  6. g) Uso indiscriminado do material biológico humano em pesquisa. Como é agora: o Brasil tem normas específicas para o uso de material biológico humano em pesquisas: a Resolução CNS 441/11 e a Portaria do Ministério da Saúde 2.201/11. Estas normas estabelecem regras claras para a coleta, armazenamento e uso de material biológico humano em pesquisas. Qual a proposta do PL-200: o uso do material biológico humano passa a ser decidido por critérios dos Comitês de Ética. Contudo, o PL ignora a existência das normas específicas no país para o uso de material biológico humano em pesquisas. Consequências da aprovação do PL-200: tornaria indiscriminado o uso de material biológico humano em pesquisa no Brasil. Além do mais, o PL não enfatiza a proibição de patenteamento e comercialização de material biológico humano no país (Constituição Federal, Art. 199; Lei nº 9.279/96). Quem sairia perdendo, mais uma vez, é o participante da pesquisa, cujo material biológico cedido poderia ser armazenado e usado de forma indiscriminada e abusiva, como já aconteceu em um passado não muito distante.

CONCLUSÃO

O Sistema CEP/CONEP está ameaçado pelo Projeto de Lei (PL) nº 200/2015 proposto no Senado. O PL, além de tentar extinguir o atual sistema de análise ética, coloca em risco os direitos dos participantes de pesquisa conquistados nas últimas duas décadas, ao longo da história do Sistema CEP/CONEP e do Conselho Nacional de Saúde. Também retira dos brasileiros o controle social das pesquisas que acontecem no país. Trata-se de retrocesso sem precedentes que, em última análise, prejudica a sociedade brasileira.

Hoje, o Sistema CEP/CONEP (Resolução CNS 466/12) tem por objetivo proteger os sujeitos participantes das pesquisas em seus direitos e assegurar que as pesquisas sejam realizadas de acordo com princípios éticos no Brasil.

O Projeto de Lei 200/2015 (PL), tramitando no Senado, poderá colocar em risco os direitos dos sujeitos da pesquisa, conquistados nas últimas décadas, ao longo da história do Sistema CEP/CONEP e do Conselho Nacional de Saúde.

Tal Projeto de Lei – 200/2015 significa um retrocesso sem precedentes que e, como já dissemos poderá prejudicar a sociedade brasileira, na visão do plenário do CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM.

Afinal qual a proposta do PL-200/2015? Assumir a Resolução CNS 466/12 e após o fim do estudo e o participante da pesquisa só terá direito ao medicamento em casos excepcionais. Quando houver justificativa científica, o placebo pode ser usado em pesquisas, mesmo quando há tratamento conhecido para uma doença.

Temos a ressaltar que o Sistema CEP/CONEP está em constante evolução e aprimoramento, sendo fruto de quase 20 anos de discussão no Conselho Nacional de Saúde (Resolução CNS 466/12).

O PL-200/2015 ignora a existência da CONEP, uma comissão do Conselho Nacional de Saúde/Ministério da Saúde, passando o controle da ética em pesquisa para as autoridades sanitárias. E a sociedade, com certeza, estará perdendo com esta investida. O CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM visa a proteção das pessoas da sociedade e se manifesta contrário a qualquer ação que possa ferir a ética e a dignidade humana, especialmente no que diz respeito a ética em seres humanos

Os Comitês de Ética em Pesquisa estão vinculados a alguma instituição (principalmente Universidades, Hospitais e Secretarias de Saúde), sendo registrados e supervisados pela CONEP (Resolução CNS 466/12). Já o PL-200/2015 cria dois tipos de Comitês de Ética: o Institucional e o Independente. Os Comitês de Ética Independentes não teriam laços institucionais, sendo sua existência vinculada a recursos financeiros próprios ou externos

O Plenário do CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM tem como questionamento o porquê da necessidade de mudar a Resolução CNS 466/12 se mantêm cientificidade, rigor, e atende ao interesse social e ético da comunidade.

Reconhecemos o PL-200/2015 como um retrocesso na proteção da sociedade no que diz respeito a pesquisa em seres humanos. 

Brasília 11 de agosto de 2015 

Dorisdaia Carvalho de Humerez

Conselheira Federal do Cofen

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